quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Os Castelos - Mensagem - Fernando Pessoa

A Europa jaz, posta nos cotovelos:
De Oriente a Ocidente jaz, fitando,
E toldam-lhe românticos cabelos
Olhos gregos, lembrando.

O cotovelo esquerdo é recuado;
O direito é em ângulo disposto.
Aquele diz Itália onde é pousado;
Este diz Inglaterra onde, afastado,
A mão sustenta, em que se apoia o rosto.

Fita, com olhar esfíngico e fatal,
O Ocidente, futuro do passado.

O rosto com que fita é Portugal.


Fernando Pessoa


Neste poema, à semelhança de Vasco da Gama, nas estrofes 6 a 21 do Canto III de Os Lusíadas, Pessoa apresenta Portugal. Fá-lo, como fizera o Gama, inserindo-o como cabeça da Europa, uma Europa, figura feminina, deitada, e fitando "com olhar esfíngico e fatal", em posição de expectativa, o Ocidente, sua vocação histórica - visto também como "futuro do passado".
Se olharmos para um mapa da Europa, concluímos que é, de facto, possível imaginá-la como mulher e reclinada, correspondendo os "cotovelos" à Itália e Inglaterra, onde se encontram, afinal, as raízes culturais que fazem a identidade europeia - o Sul (e lá vem a referência aos "olhos gregos") e o Norte (referência aos "românticos cabelos").
Assim sendo, resta Portugal, extremo ocidental da Europa, que Vasco da Gama definiria como "cume da cabeça / da Europa toda", "onde a terra acaba e o mar começa / e onde Febo repousa no Oceano". Para Pessoa, Portugal é o rosto da Europa, aquele que "fita" (o verbo fitar aparece 3 vezes neste pequeno poema, como se de uma verdadeira obsessão europeia e portuguesa se tratasse), o mar ocidental, seu destino, seu futuro (e futura glória e dor, como sabemos e Pessoa reafirmará).

Em termos formais, o poema é constituído por quatro estrofes irregulares, sendo a primeira uma quadra, a segunda uma quintilha e a terceira um dístico, finalmente a última é composta apenas por um verso, monóstico. Esta irregularidade também se verifica ao nível da métrica, apresentando versos variam entre seis sílabas métricas e onze. A rima predominante é a pobre (cotovelos / Cabelos), havendo no entanto dois exemplos de rica (Portugal / fatal e rosto / disposto). Predomina também a rima consoante (fitando / lembrando) e a rima feminina ou grave, havendo apenas um exemplo de rima aguda (fatal / Portugal).

2 comentários:

Nilson Barcelli disse...

Mas jamais seremos o rosto da Europa como o fomos no passado com as descobertas...
Gosto de ler as tuas análises poéticas.
Acho que não chegaste a publicar o meu poema, que já não sei qual era. Lembro-me que cheguei a colocá-lo num comentário deste teu blog, mas também não me lembro qual...
Se ainda quiseres fazê-lo, o melhor é dizeres-me por e-mail qual é o que queres...
Querida amiga Mena, tem um bom fim de semana.
Beijo.

Rita disse...

Infelizmente, tens razão!

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