Sobre o AO90, transcrevemos de seguida, com a devida vénia e porque nos parece ser de interesse público, um trecho da mensagem do Professor António de Macedo.
É inevitável trazer à lembrança a famosa passagem de Bernardo Soares / Fernando Pessoa no Livro Desassosssego, em que diz:
“…Minha pátria é a língua portuguesa. [...] Sim, porque a ortografia também é gente. A palavra é completa vista e ouvida. E a gala da transliteração greco-romana veste-ma do seu vero manto régio, pelo qual é senhora e rainha.”A violenta desfiguração que o novo Acordo quer impor à língua é um crime grave. Com ele, a língua original do trovador D. Dinis, de Gil Vicente, do Pe. António Vieira… passou a ser um sub-dialecto do brasileiro, que nem os brasileiros reconhecem, porque eles continuam a escrever aspecto, perspectiva, espectador, excepcional, concepção, recepção… e nós com o novo Acordo passamos a escrever aberrações como aspeto, perspetiva, espetador, excecional, conceção, receção…
O iluminado legislador que produziu a novo AO parece ignorar a tendência fonogrâmica das línguas, a inevitável “colagem” da letra à fonética. Quando vejo escrito, como agora, conceção e receção, por exemplo, a minha tendência é pronunciar como concessão e recessão… A tendência fonogrâmica do português brasileiro é abrir os sons, ao passo que a do português de Portugal é fechá-los. Por isso a grafia constitui uma marca distintiva fundamental. Por exemplo, o novo AO quer que se escreva afetar e adotar, tal como no Brasil, em vez de afectar e adoptar. Com ou sem as letras aparentemente mudas como o “c” ou o “p”, o brasileiro pronunciará sempre àfètár e àdòtár, ao passo que português sem o “c” e sem o “p”, terá a tendência fonogrâmica de pronunciar âf´tár e âdutár. Se passo a escrever correto em vez de correcto, terei tendência, enquanto português, para pronunciar kurrêto, como em carreto ou coreto…
Enfim, como o dispositivo legal que promulga o novo AO é uma Resolução da Assembleia da República, e não uma Lei ou um Decreto-Lei, terá sempre o mero valor de recomendação, ao contrário de um Decreto-Lei que é vinculativo.
Chamo a atenção que o Decreto-Lei que promulga o Código do Direito de Autor e Direitos Conexos, na hierarquia legislativa, sobrepõe-se a uma resolução da AR, por isso sugiro aos Autores que se não conformam com a nova ortografia e desejem continuar a escrever como os nossos pais nos ensinaram, que leiam atentamente o n.º 1 do Art. 56.º do Código do Direito de Autor, em articulação com o Art. 93.º do mesmo Código. Nós, Autores, temos sempre a “opção ortográfica de carácter estético” a nosso favor.
António de Macedo subscreveu a Iniciativa Legislativa de Cidadãos pela revogação da entrada em vigor do “acordo ortográfico”.
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