segunda-feira, 11 de junho de 2012

O Tesouro - Eça de Queirós




Tempo


Tempo histórico – século IX – Reino das Astúrias/ Maravedis - moeda árabe - os árabes invadiram a península ibérica no século VIII
(no século X encontramos já constituído o Reino de Leão, que sucedeu ao das Astúrias)



Tempo da história -  a acção inicia-se no Inverno -> Primavera  - manhã de domingo 
-> tarde – a tarde descia – a sombra se adensava -> noite – anoiteceu.
A acção passa-se durante alguns meses, pelo menos  três, quatro meses.


Tempo do Discurso- A acção passa-se durante alguns meses, pelo menos  três (três parágrafos iniciais), mas o cerne da acção passa-se em apenas 1 dia – manhã, tarde e noite – a que corresponde a maior parte da narrativa.
Para que isto aconteça numa narrativa curta como é o conto tem de haver elipses e sumários

Sumário – 2º parágrafo – todo o inverno se passa num só parágrafo.

Elipse – tardes de Inverno – situação inicial e o início do desenvolvimento – ora, na Primavera…

Analepse - quando o narrador recorda o que Guanes fez quando foi a Retortilho – final do desenvolvimento.
Prolepse - Início do da 3ª parte – quando Rui imagina ou conjectura o que fará quando chegar a Medranhos.
  





A referência ao "Reino das Astúrias" permite-nos localizar a acção no século IX, já que os árabes invadiram a Península Ibérica no século VIII (a ocupação iniciou-se em 711 e prolongou-se por vários anos, sem nunca ter sido concluída); por outro lado, no século X encontramos já constituído o Reino de Leão, que sucedeu ao das Astúrias. A acção decorre entre o Inverno e a Primavera, mas concentra-se num Domingo de Primavera, estendendo-se de manhã até à noite. O Inverno está conotado com a escuridão, a noite, o sono, o declínio, a morte. É no Inverno que nos são apresentadas as personagens, envoltas na decadência económica, no isolamento social e na degradação moral (“E a miséria tornara estes senhores mais bravios que lobos.”). Por sua vez, a Primavera tem uma conotação positiva, associa-se à luz, à cor, ao renascimento da natureza, sugere uma vida nova, enquanto o Domingo é um dia santo, favorável ao renascimento espiritual. A acção central inicia-se na manhã de Domingo e progride pelo dia fora. À medida que a noite se aproxima, a tragédia vai-se preparando. Quando tudo termina, com a morte sucessiva dos irmãos, surge também a noite (“Anoiteceu.”). A acção estende-se do Inverno à Primavera, mas o seu núcleo central concentra-se num dia, desde manhã até à noite. A condensação de um tempo da história tão longo (de três ou quatro meses) numa narrativa curta (conto) implica a utilização sistemática de sumários ou resumos (processo pelo qual o tempo do discurso é menor do que o tempo da história). Nos momentos mais significativos da acção (decisão de repartir o tesouro e partilha das chaves, bem como a argumentação de Rui para excluir Guanes da partilha) o tempo do discurso tende para a isocronia (igual duração do tempo da história e do tempo do discurso, por causa do diálogo entre as personagens), sem no entanto a atingir. É possível também identificar no texto um outro processo de redução do tempo da história, a elipse (eliminação, do discurso, de períodos mais ou menos longos da história). A parte inicial da ação é localizada no Inverno (...passavam eles as tardes desse Inverno...) e logo a seguir o narrador remete-nos para a Primavera (Ora, na Primavera, por uma silenciosa manhã de domingo...).Quanto à ordenação dos acontecimentos, predomina o respeito pela sequência cronológica. Só na parte final nos surge um recuo no tempo (analepse), quando o narrador abandona a postura de observador e adopta uma focalização onisciente, para revelar o modo como Guanes tinha planejado o envenenamento dos irmãos, manifestando dessa forma a natureza traiçoeira do seu caráter. Frequentemente, o recuo do tempo permite esconder da narração pormenores importantes para a compreensão dos acontecimentos, mantendo assim um suspense favorável à tensão dramática.


"Ora, na Primavera, por uma silenciosa manhã de domingo, andando todos três na mata de Roquelanes a espiar pegadas de caça e a apanhar tortulhos entre os robles, enquanto as três éguas pastavam a relva nova de Abril - os irmãos de Medranhos encontraram, por trás de uma moita de espinheiros, numa cova de rocha, um velho cofre de ferro. Como se o resguardasse uma torre segura, conservava as suas três chaves nas suas três fechaduras. Sobre a tampa, mal decifrável através da ferrugem, corria um dístico em letras árabes. E dentro, até às bordas, estava cheio de dobrõres de ouro!"

Repara que o início do conto começa no Inverno, associado à ideia de escuridão. O facto de a acção principal começar na Primavera, associada à ideia de renovação da Natureza, e numa "silenciosa manhã de domingo", que representa a luminosidade e a tranquilidade, permite-nos pensar que a vida dos três irmãos poderá mudar.


"Anoiteceu. Dois corvos, de entre o bando que grasnava além dos silvados, já tinham pousado sobre o corpo de Guanes. A fonte, cantando, lavava o outro morto. Meio enterrada na erva negra, toda a face de Rui se tornara negra. Uma estrelinha tremeluzia no céu. O tesouro ainda lá está, na mata de Roquelanes.

A estrela que reluz no céu nega a total obscuridade, apresentando-se como um sinal de esperança, após a morte dos três irmãos.
O facto de o tesouro se manter na mata deixa em aberto o desfecho da história. Talvez possa ser encontrado por outras personagens, dando origem a uma nova história...

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