sexta-feira, 9 de setembro de 2011

"Mas, Senhor, o que raio é um rico?"

O recente debate sobre política fiscal é tão interessante quanto intrincado. Pergunta-se: quem tem mais deve contribuir mais? Eis um daqueles dilemas de solução impossível. Tirando o sentido de justiça e o mais elementar bom senso, não há nada que nos ajude a tomar uma posição definitiva. Devem os ricos pagar mais impostos do que os outros? É uma questão complexa. Arrebanhar metade do 13.º mês acima do salário mínimo é incontroverso, mas quando se trata de taxar grandes fortunas os analistas tornam-se filosóficos: mas o que é um rico?, perguntam. Parece tratar-se de um conceito vago e populista, comentam, com admirável prudência intelectual. Fazia falta um destes analistas no versículo 24 do capítulo 19 do Evangelho segundo São Mateus. Quando Jesus dissesse que é mais fácil um camelo entrar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus, o analista havia de contrapor: "Mas, Senhor, o que raio é um rico? Abstende-vos de usar conceitos vagos e populistas." No entanto, Jesus Cristo, talvez por ser filho de quem é, pode dizer o que lhe apetece sem ser acusado de demagogia. Uma sorte que Jerónimo de Sousa não tem.

Na verdade, os analistas têm razão. A riqueza é um conceito vago. Tão vago que o homem mais rico de Portugal conseguiu dizer esta semana que não era rico. Ora, se o homem mais rico de Portugal não é rico, isso significa que em Portugal não há ricos, o que inviabiliza a criação de um imposto especial para eles. É impossível taxar quem não existe, como a direção-geral de impostos bem sabe - até porque já tentou.

Toda a gente conhece aquele poema do António Gedeão sobre Filipe II: o rei era riquíssimo (passe a imprecisão e o populismo) e tinha tudo. Ouro, prata, pedras preciosas. O que ele não tinha, diz o último verso, era um fecho éclair. Américo Amorim tem tudo, incluindo um fecho éclair. Talvez não tenha vergonha, mas também vem a calhar: nem criando um imposto sobre a vergonha o apanham.

Américo Amorim constitui, por isso, um mistério tanto para a fiscalidade como para a teologia. Sendo o homem mais rico de Portugal, talvez não entre no reino de Deus. No entanto, na qualidade de pobre de espírito, tem entrada garantida.

Ricardo Araújo Pereira


No tempo de Jesus Cristo, as muralhas de Jerusalém tinham pequenas portinholas chamadas FUNDO (buraco) DE AGULHA. Os grandes portões da cidade fechavam às seis horas da tarde. Depois desta hora, a única maneira das caravanas de camelos entrarem na cidade de Jerusalém era através do fundo de agulha.

Só que o camelo só conseguia transpor essa portinhola de JOELHOS e DESCARREGADO, (andar de joelhos não constitui qualquer problema para um camelo). Ora, isto quer dizer que para entrarmos no Reino dos Céus, devemos fazê-lo humildemente (estar de joelhos) e sem carga (despojados de todos os nossos bens materiais).

Nós, no fundo, não possuímos nada. Nós, quando partirmos, não levaremos nada, deixaremos tudo aqui. Logo, para entrarmos no reino dos céus, vamos ter de o fazer sem os nossos bens materiais.

O dinheiro e os bens materiais são instrumentos que podemos usar para diversos fins, bons ou maus, a escolha é nossa. A nossa riqueza não deve ser gasta apenas connosco ou guardada a sete chaves, mas deve ser usada também com as outras pessoas.

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