domingo, 15 de janeiro de 2012

A propósito da amizade entre homens e mulheres...

“Somos só amigos, nunca acontecerá nada entre nós!” Será verdade?



A propósito deste vídeo, a Ná falou-me deste texto de Miguel Esteves Cardoso... Procurei-o, li-o e não resisti... Aqui fica!
Ri-me a bom rir, mas, por experiência própria, não deixo de concordar com o que ele diz!


"A amizade, entre um homem e uma mulher é (o leitor que escolha) um bico-de-obra; uma coisa muito linda; ainda mais complicado que o amor; absolutamente impossível; amizade da parte da mulher e astúcia da parte do homem; astúcia da parte da mulher com amizade da parte do homem; só possível se a mulher for forte e feia; impossível se o homem for minimamente atraente; receita certa para a desgraça; prelúdio certo para o romance; indescritível; inenarrável; sempre desejável; o que Deus quiser; o diabo. O leitor que não tenha escolhido todas as hipóteses não percebe nada disto. Quanto à leitora, o mais provável é ter ficado a pensar , já que as mulheres portuguesas, por dura experiência, percebem mais destas coisas que os homens. Em Portugal, a amizade entre pessoas de sexos opostos (ou sexualidades opostas) é sempre muito problemática, dada a chamada «cultura vigente». A cultura vigente é dominada pelo conhecido Factor SPAC, que influencia todas as relações entre homens e mulheres. O factor SPAC (que significa, em repreensível português, Salto Para A Cueca está sempre presente. E a mulher que repara que o seu grande amigo está disposto a discutir todos os problemas dela com a maior paciência e compreensão, mas que começa a arroxar e a esverdear, a puxar o lustro à cadeira com o rabo, sempre que ela lhe revela estar muito feliz com um novo amor. Ou (pior ainda) com um velho. Se o amigalhaço suporta a miséria mais camiliana com um sorriso, mas não aguenta a mínima menção de alegria, se ajuda muito nos dissabores e desamores, mas empata ainda mais nos sabores e amores, levanta-se no espírito da mulher, legitimamente ou não, o factor SPAC. E ela interroga-se: «Se calhar este também me quer Saltar Para A Cueca?" E se calhar quer. Se isto é ou não um crime, é o que se vai ver. O problema não é exclusivo das mulheres, também os homens podem atribuir a certos comportamentos femininos uma medida do factor SPAC (sobretudo o tipo de homem que pensa em Catherine Spaak, a esquecível actriz de cinema, antes de pensar em Paul-Henri Spaak, o memorável espírito impulsionador da CEE). O homem português tende a distinguir mais claramente entre Amigos e Amigas. Os Amigos são para copos e conversas escandalosas de bola e de «boas». E são também, nos casos extremos, para Sempre. As Amigas são para chávenas de chá e conversas profundas sobre a natureza do Inverno. Isto sem falar nos típicos caraméis para quem amigas é: todas as pessoas do sexo oposto com número de telefone, olhos bonitos e uma possibilidade mínima de 1 por cento na tabela SPAC. A amizade entre homens e mulheres pode chamar-se isenta de factor SPAC, quando se fala livremente, como os amigos falam, de terceiros amores. Se uma rapariga se sente a vontade para chegar ao pé de um rapaz e dizer "Pá! Sabes o que me aconteceu? Apaixonei-me! Não é porreiro?" e se o rapaz acha que sim, que é bastante porreiro, então pode dizer-se que o factor SPAC está de férias. Claro que haverá sempre alguns ligeiros ciúmes «Afinal já não posso ir contigo à festa — vou com a Gisela / o Giselo ao concerto, desculpa lá». Mas nada que ponha em perigo a amizade. Uma das maneiras tradicionais de atenuar o factor SPAC e S mesmo PAC. «Pronto, agora que já estamos despachados neste departamento» diz a mulher para o homem, atirando-lhe o maço de cigarros [está bem, pronto, de SG Pack], — vamos lá a ver se ficamos amigos». Os ex-amantes, depois do grande holocausto, podem dar bons amigos (desde que não se tenham amado de mais e dado cabo dos dois coraçãozinhos logo à partida). No cenário pós-SPAC (reza a teoria do Cacaracá conforme se expõe nos cafés do Porto e Lisboa), a curiosidade sexual é imediatamente saciada e a amizade pode florescer, desimpedida das ervas daninhas do desejo. E caso o salto seja em altura, homem e mulher, presumivelmente, decidem continuar amantes. Esta teoria (do Machão-Latino, ou não presta, porque supõe que o SPAC é uma coisa simples e toda a gente sabe que, na cama, fazer amor é uma coisa, fazer só por fazer é outra, mas fazer amizade não é nem uma coisa nem outra. Mas a teoria oposta (da Machona-Lusitana, «M-L à mesma) também não serve. Imaginando que o factor SPAC nunca existe entre um homem e uma mulher que sejam verdadeiros amigos, caem no simplismo contrário. Tal como o homem que pensa «Que chatice! Isto nunca mais passa da amizade para o que interessa!), a mulher que pergunta: «Será que este é mesmo meu amigo ou estará a fazer-se ao piso?» está a cometer o mesmo erro. É como perguntar acerca de um pastel de nata se é mesmo feito de farinha ou só de nata. Portugal não é só Lisboa, mas Lisboa também é Portugal (e não é pouco). Se fosse como os M-L machos e fêmeas diziam, então os homens só podiam ter amigas muito feias (o que é limitativo) e as mulheres só podiam ter amigos muito desinteressados (o que seria muito desinteressante). A própria ideia de uma amizade inocente põe a hipótese de uma amizade culpada. Ora ninguém pode ter culpa de ser amigo doutra pessoa. A verdade é outra. Como as mulheres são diferentes dos homens (por exemplo, os segundos sentem-se mais obrigados a tentar SPAC das primeiras do que as primeiras PAC dos segundos), é natural que essa diferença se faça sentir nas relações de amizade. Quando não existe a mínima atracção de parte a parte, tudo bem. Mas quando existe, também não é mau. Alias, se houver uma gestão elegante dos vários frissons envolvidos, pode até ser melhor. Vejamos. Em geral, as mulheres portuguesas gostam mais de ter amigos do que ter amigas. 0 Problema é que os homens também. Isto leva a um desequilíbrio considerável na oferta e na procura de amizades. Posto de maneira brutal, não faltam mulheres dispostas a serem amigas de homens. Os homens é que faltam mais. E aproveitam-se disso. Por outro lado, as mulheres, regra geral, tornam-se amigas dos homens pondo a raridade e o valor da amizade acima da maior vulgaridade do SPAC. Tanto mais que o homem português não põe facilmente a hipótese de uma mulher se tornar amiga dele para lhe SPAC. O raciocínio típico do Homo lusitanus é simples: «0h... se ela me quisesse SPAC escusava de estar com tanto trabalho! Em Portugal é assim. O homem acha que, no que toca a SPAC, é ele que tem de trabalhar. E a mulher também conseguiu convencer o homem que é isso que ela acha também. Logo, o trabalho de amizade de uma mulher nunca é levado a mal pelo homem (é levado por outras mulheres; mas essa é outra história). Em contrapartida, o trabalho do homem é sempre posto em causa. E muito bem posto, aliás. Se ele propõe «Talvez fosse melhor ficarmos aqui em casa hoje à noite, não ouviste o boletim meteorológico?», ela faz muito bem em pensar: «Está bem, filho, já vais ver a imagem do satélite...». Mas faz mal em duvidar da amizade dele só por causa disso. A verdade é que o amigo talvez gostasse de lhe SPAC, não lhe cairia mal, não senhor, mas pronto, se não puder ser, ninguém morre por causa disso, ficamos amigos à mesma. Seja por natureza, seja por formação, o homem tem sempre de manter presente a possibilidade de SPAC da mulher. Pode ser de maneira Roskoff (tentando abertamente) ou pode ser de maneira Rachmaninoff (pensando, pianinho, na eventualidade de ficarem só os dois numa ilha deserta, depois de uma bomba atómica ter destruído toda a humanidade), mas lá ter de ser, tem. Resumindo: para as mulheres, como amigas de homens, a «amizade, amizade, amores à parte», enquanto para os homens é mais «amizade, amizade, e uns amores a parte, se puder ser, se faz favor, se não também não faz mal». Na verdade, a amizade e o factor SPAC não são mutuamente exclusivos. Pode ser-se muitíssimo amigo de alguém que se deseje muito, pouco, muitopouco ou nada. O factor SPAC tem o mesmo peso na amizade que o MaxFactor no amor. Nem mais."


Miguel Esteves Cardoso

2 comentários:

mfc disse...

Hummm... vou pensar!!
Mas é capaz de não ser muito fácil!!

Rita disse...

mfc, parece incrível, mas a maioria diz que tal não é na realidade possível!

Bj