A coisa funciona assim. Um professor é avaliado, com aulas observadas, registos de desempenho devidamente documentados, em respeito integral com as disposições legais para a avaliação de professores. O professor relator entrega-se, como lhe compete, à escrupulosa avaliação do docente. Findo todo o processo de dois anos, decide atribuir-lhe, imagine-se, 8. Ou 9. Ou mesmo 10. Escolhamos o caso mais revelador: 10. O avaliando tem 10. O avaliador entrega, como lhe compete, o resultado da sua avaliação à comissão de avaliação.
E então o disparate começa a ficar mesmo perturbador.
Quando esta reúne para ratificar a decisão do relator, é imediatamente obrigada a alterar as informações fornecidas por quem avaliou, apenas porque, informaticamente, não pode lançar mais "excelentes". Ou seja, um professor que teve nota 10, verá a sua avaliação modificada para um valor fictício, apenas para que não surja a menção "excelente", mas sim a menção "bom", para desta forma se poder respeitar o cômputo autorizado de quotas de 5%.
E, de repente, alguém diz que o problema está na aplicação informática. Pois é. Não está. Nenhuma aplicação informática se faz a si mesma. Preside-lhe um algoritmo que é estabelecido não pelo informático, mas pelo gestor ministerial. Não se pode aceitar que uma comissão aceite alterar artificialmente e sem critério a nota de 10 para 7,9, sem saber explicar por que razão essa nota, e não outra qualquer, passa a ser o registo oficial do desempenho de um docente, que tem deste modo uma classificação que nenhum avaliador alguma vez lhe atribuiu.
Concretizando, esta prática é nada menos do que fraudulenta e significa que um professor que teve uma avaliação de "excelente" observada no terreno, nem sequer pode ter no seu registo o resultado da sua avaliação real. Passa a ter 7,9 em vez de 10, apenas porque a aplicação informática não aceita a informação que realmente corresponde à avaliação concreta e verdadeira que lhe foi atribuída por quem a lei exige que seja o seu avaliador durante dois anos de desempenho. Pelo contrário, exige-se à comissão de avaliação que modifique conscientemente os valores fornecidos pelo avaliador, dados que, simplesmente, deixam de existir. O seu trabalho e o do avaliando são completamente improcedentes. São alterados sem autorização e sem nenhum critério que não seja o de existir um aplicação informática que não permite que haja avaliados com informação quantitativa de 10 e qualitativa de "bom".
Trata-se, pois, de algo de estratosférico.
Mais. Não satisfeita com este falseamento consciente das classificações dos avaliadores e com a improcedência completa do trabalho dos relatores e avaliandos, surge a estapafúrdia questão das quotas. 5% de "excelentes" por grupos de avaliados, que muitas vezes há-de corresponder a grupos disciplinares. Isto significa que, em grupos que tenham 3 professores, 5% de 3 equivalha a 0,15. Como a lei exige que se arredonde este valor à unidade mais próxima, o resultado é simples de ver: nenhum professor desse grupo alguma vez poderá ascender à classificação de "excelente". Faça ou seja ele o que fizer ou fôr. Nunca terá ou será "excelente" aquele professor que pertença a um grupo disciplinar com reduzido número de docentes.
Mais. Num grupo como o de evt onde existe, e bem, o sistema de par pedagógico, será possível para os seus docentes atingir a menção de "excelente", simplesmente porque têm o dobro de professores daquela outra disciplina que, tendo o mesmo número de horas que evt tem, apenas conta com metade dos docentes para a leccionar.
Mais. Em escolas cujo número de alunos esteja a descer, as necessidades de docentes vão também reduzir, o que faz com que o número de professores necessário reduza também, o que provoca a diminuição de possibilidades de atingir a menção de excelente.
Mais. A reforma curricular que venha a diminuir o número de horas semanais a uma qualquer disciplina concorre abertamente para impedir objectivamente que os professores dessa disciplina, por serem em menor número face à redução de necessidades, possam atingir a menção de "excelente" e assim obter a desejada bonificação de um ano.
Ou seja, uma coisa é ignorar que os professores andam embrulhados com uma avaliação de desempenho que não tem efeitos rigorosamente nenhuns numa carreira que já congelou e não virá tão cedo a descongelar, tornando risíveis e nada menos do que isso todos os esforços ou voluntarismos de qualquer professor para corrigir ou para melhorar o que quer que seja dentro da sala de aula. Outra coisa diferente é perceber que o próprio sistema de avaliação impede que um professor, por melhor que seja, por mais que faça, consiga, ao menos ver no seu registo a verdadeira avaliação que lhe for atribuída pelo seu avaliador.
O mais certo é que depois de toda a sua "excelência", acabe por ver os seus colegas da comissão de avaliação a modificar-lhe, alpacamente, por razão nenhuma, as classificações que obteve no processo que atravessou ao longo de dois anos.
Fica a interrogação maior:
O que pensará o mais negligente dos professores de tudo isto? Como se apaga aquele sorriso que ele transporta todos os dias, sempre que pensa em avaliação, consciente de que a lei lhe confere tamanho grau de amnistia?
Trouxe daqui esta excelente publicação!
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