Vejamos agora as características das personagens mais importantes da intriga trágica:
Afonso da Maia
Pondo de parte o período revolucionário da sua juventude, em que, para desgosto de seu pai, fora “O mais feroz jacobino de Portugal”, Afonso da Maia, quer sofrendo corajosamente a tragédia de seu filho Pedro, quer orientando a educação de seu neto Carlos e sendo a maior vítima da tragédia dos seus amores incestuosos, conserva sempre a mesma dignidade, é sempre uma personalidade clássica. Antecipadamente marcado para a fatalidade dramática, nunca se deixou dissolver na comédia da vida.
A caracterização directa que dele faz o narrador (pág. 12) nunca foi contradita pela sua actuação na vida real (caracterização indirecta). Veja-se, por exemplo, a maneira estóica como ele suporta o desastre do filho Pedro e sobretudo a tragédia do neto Carlos. Ao encontrar-se pela última vez com Carlos, “Afonso… lívido, mudo, espectral…, os dois olhos vermelhos, esgazeados, cheios de horror, caíram sobre ele, varando-o até às profundidades da alma… depois, sem uma palavra… os seus passos perderam-se no interior da casa, lentos, abafados, cada vez mais sumidos, como se fossem os derradeiros que devesse dar na vida”.
Afonso, como vítima de duas tragédias, bem poderia ser uma personagem profundamente modelada, se o autor fosse mais fadado para a análise interior. No entanto, esta personagem não ultrapassa o esquematismo das funções que lhe foram destinadas no romance. Embora potencialmente modelada, na realidade pouco se eleva acima da personagem plana.
É a personagem mais valorizada por Eça, e a mais simpática do romance, não se lhe conhecendo defeitos. É um homem de carácter, culto e requintado nos gostos. Em oposição a seu pai, Caetano da Maia, partilha das ideias liberais, ama o progresso, fruto de um esforço sério e não uma utopia romântica. É generoso com os amigos e os necessitados, não abdicando dos seus sérios princípios morais. É um modelo de autodomínio em todas as circunstâncias; é o sonho de um Portugal impossível por falta de homens capazes.
O termo jacobino surge durante a Revolução Francesa para designar os membros de um grupo político republicano com sede no antigo convento de jacobinos e que, mais tarde, passou a significar membro de um partido dito democrático, frequentemente inimigo da religião. Com a mudança da Assembleia Constituinte para Paris, em Outubro de 1789, este grupo encontrou uma sede no Convento dos Jacobinos na Rua Saint-Honoré e, embora se designasse Sociedade dos Amigos da Constituição, os seus membros passaram a ser conhecidos por jacobinos. Na confusão reinante, após o colapso da Monarquia, começaram a surgir diversos movimentos e comités a pretenderem controlar o poder. Aí surge a tirania revolucionária de Robespierre e dos defensores da "Virtude pelo Terror". Os jacobinos, politicamente, representavam os sans-culottes, isto é, os pobres e a pequena burguesia, assim chamados por não usarem, como os nobres, os calções curtos com meias. Depois de aceitarem a monarquia constitucional e após a fuga do rei, tornaram-se ardorosos defensores de uma república revolucionária.
In Infopédia
No excerto que se segue, há uma caracterização directa de Afonso da Maia:
“Afonso era um pouco baixo, maciço, de ombros quadrados e fortes: e com a sua face larga de nariz aquilino, a pele corada, quasi vermelha, o cabelo branco todo cortado à escovinha, e a barba de neve aguda e longa - lembrava, como dizia Carlos, um varão esforçado das idades heróicas, um D. Duarte de Menezes ou um Afonso de Albuquerque. E isto fazia sorrir o velho, recordar ao neto, gracejando, quanto as aparências iludem!”
Cap. I
A partir de certas frases e expressões deste excerto ficamos a conhecer algumas das características psicológicas de Afonso da Maia.
“ (...) lembrava, como dizia Carlos, um varão esforçado das idades heróicas, um D. Duarte de Meneses ou um Afonso de Albuquerque." - Homem de carácter
"Não, não era Meneses, nem Albuquerque, apenas um antepassado bonacheirão que amava os seus livros, o conchego da sua poltrona, o seu whist ao canto do fogão." - Culto e requintado nos gostos
"Parte do seu rendimento ia-se-lhe por entre os dedos, esparsamente, numa caridade enternecida." – Generoso
“Esta existência nem sempre assim correra com a tranquilidade larga e clara dum belo rio de verão. O antepassado, cujos olhos se enchiam agora duma luz de ternura diante das suas rosas, e que ao canto do lume relia com gosto o seu Guisot, fora, na opinião de seu pai, algum tempo, o mais feroz Jacobino de Portugal! E todavia, o furor revolucionário do pobre moço consistira em ler Rousseau, Volney, Helvetius, e a Enciclopédia; em atirar foguetes de lágrimas à Constituição; e ir, de chapéu à liberal e alta gravata azul, recitando pelas lojas maçónicas Odes abomináveis ao Supremo Arquitecto do Universo. Isto, porém, bastara para indignar o pai. Caetano da Maia era um português antigo e fiel que se benzia ao nome de Robespierre, e que, na sua apatia de fidalgo beato e doente, tinha só um sentimento vivo - o horror, o ódio ao Jacobino, a quem atribuía todos os males, os da pátria e os seus, desde a perda das colónias até às crises da sua gota. Para extirpar da nação o Jacobino, dera ele o seu amor ao Sr. infante D. Miguel, Messias forte e Restaurador providencial... E ter justamente por filho um Jacobino, parecia-lhe uma provação comparável só às de Job!”
Cap. I
Neste excerto é bem visível o contraste que existe entre Afonso da Maia, representante do liberalismo, e seu pai, Caetano da Maia, um conservador e religioso, representante do absolutismo.
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Afonso da Maia |
Caetano da Maia
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Valores |
Valores liberais |
Valores tradicionais e conservadores |
Leituras |
Guizot, Rousseau, Volney, Helvécio
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Preferências políticas |
Liberalismo | Antijacobino Miguelista convicto |
32.
1 comentário:
adorei este blog e deu me muita ajuda para fazer um trabalho. obrigado :)
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