Nun'
Álvares Pereira
Que auréola te cerca?
É a espada que, volteando,
Faz que o ar alto perca
Seu azul negro e brando.
Mas que espada é que, erguida,
Faz esse halo no céu?
É Excalibur, a ungida,
Que o Rei Artur te deu.
Esperança consumada,
S. Portugal em ser,
Ergue a luz da tua espada
Para a estrada se ver!
Este poema surge na primeira
parte do livro “a mensagem” - O “Brasão” - a primeira das três partes do livro
Mensagem, de Fernando Pessoa. O título “Brasão” não foi escolhido por acaso,
sendo brasão uma representação que se utiliza de símbolos a fim de identificar
famílias, indivíduos ou regiões pelos seus actos de nobreza e heroísmo. Neste
título, Pessoa busca identificar de onde vem a nobreza de Portugal.
“Brasão” inicia-se com a
expressão em latim “Bellum sine Belo”, que significa “guerra sem armas”. É
dividido em cinco partes: I. Os Campos; II. Os Castelos; III. As Quinas; IV. A
Coroa e V. O Timbre. O poema acima transcrito está na quarta parte, “A Coroa”.
A coroa é o símbolo de poder e
autoridade dos governantes, desde os tempos pré-históricos. Mas a coroa também
era dada ou posta em indivíduos que não eram monarcas, sendo, neste caso, o símbolo
de grandes feitos heróicos ou conquistas de coragem. Por esta razão, Pessoa deu
a coroa a Nuno Álvares e não a um rei ou príncipe.
Neste poema, Fernando Pessoa
fala de uma auréola. A auréola que cerca Nuno Álvares Pereira é, ao mesmo
tempo, uma auréola de santidade (do guerreiro tornado monge) e uma auréola de
combate (“é a espada (…) volteando”). Quer ele dizer que a santidade que ele
alcançou resultou também dos seus actos de guerreiro, pois é a sua espada que
desenha o círculo diáfano por cima da sua cabeça, destacando-o – santo – do
comum dos homens.
Conhecendo-se a origem da
auréola que cerca Nuno Álvares Pereira - a espada - na segunda estrofe, Pessoa
fala-nos sobre essa mesma espada, dizendo-nos que a espada “que, erguida / Faz
esse halo no céu” não é uma espada qualquer, não é a espada de um comum
cavaleiro, mas “é Excalibur, a ungida”, a espada do “Rei Artur”.
Pessoa pede a Nuno Alves
Pereira, nos dois últimos versos, que erga a luz da sua espada “para a estrada
se ver”, para sabermos que caminho devemos seguir no futuro.
Na primeira parte da obra,
“Brasão”, Fernando Pessoa faz referência a personagens históricas e mitícas,
daí a presença de Nuno Álvares Pereira como líder preparado para a batalha, o
guerreiro perfeito.
Por isso, na Mensagem, Pessoa
exalta o valor incomparável de Nuno Álvares Pereira. O facto de existir uma
parte no “Brasão”, que é “ A Coroa”, destinada apenas ao poema de Nuno Álvares
Pereira, enaltece ainda mais a sua pessoa. Também Camões faz referência, explicita
ou implicitamente, a Nuno Álvares Pereira 14 vezes em “Os Lusíadas”.
Pessoa começa o poema com uma
interrogação retórica acerca daquilo de que é feito Nuno Álvares Pereira. Os
restantes versos da primeira estrofe são como que as respostas à questão
inicial. Nesta estrofe, Fernando Pessoa chega a afirmar que o valor de Nuno
Álvares Pereira é maior que o do rei Artur, já que o primeiro passou de
realidade a mito (foi beatificado), o último é apenas um mito que muitos
afirmam ter sido realidade. Para além disso, assim como o Rei Artur foi
predestinado para empunhar a Excalibur, também Nuno Álvares Pereira o foi para
içar a espada, que o guiou na batalha, a ungida.
Os dois
últimos versos do poema podem ser vistos como um conselho dado aos portugueses:
se se querem sagrar vitoriosos devem seguir o exemplo de Nuno Álvares Pereira.
A exclamação final é um pedido para que Nuno Álvares nos indique o caminho a
seguir para o império que há-de vir.
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