Cristalizações recria o quadro do trabalho dos calceteiros a que o sujeito poético assiste. O título do poema está relacionado com o brilho da luz nos charcos, cujos reflexos parecem cristais.
O título deste poema poderia ser "Num Bairro Proletário", como contraponto a "Num Bairro Moderno". Enquanto neste último o sujeito poético nos conduz através de um bairro burguês com as suas casas apalaçadas e os seus mordomos, em "Cristalizações", deambulamos por entre "Uns barracões de gente pobrezita / E uns quintalórios velhos com parreiras" que se situam nuns "sítios suburbanos, reles!"
Porém, não é apenas este aspecto que aproxima dois poemas que retratam espaços citadinos tão diametralmente opostos. Também a oposição real / fuga imaginativa está presente nos dois textos.
Tendo em conta esta oposição, é possível delimitar em "Cristalizações" dois níveis narrativos diferentes:
Com efeito, todo o poema é um hino a estes trabalhadores que abandonaram as lezírias, os montados, as planícies, as montanhas para com "os grossos maços" partirem a pedra "com que outros" fazem a calçada. Trata-se de um trabalho duro, moroso, ininterrupto - "(...) E os rapagões morosos, duros, baços, / Cuja coluna nunca se endireita"; "Homens de carga! Assim as bestas vão curvadas! / Que vida tão custosa!") - realizado ao frio, "nesse rude mês, que não consente as flores", nesse "Dezembro enérgico, sucinto".
De repente, cortando o ritmo de trabalho daqueles homens fortes, rudes - "bovinos, másculos, ossudos" - e brutos - "Como animais comuns", surge uma actrizita com "pezinhos de cabra" cuja presença desassossega aqueles trabalhadores que a encaram "sanguínea, brutamente".
No entanto, "O demonico arrisca-se, atravessa /Covas, entulhos, lamaçais depressa", continuando o seu caminho.
O posicionamento do sujeito poético face aos calceteiros, embora lhes reconheça aspectos quase que animalescos, é de uma empenhada solidariedade bem patente, quando na estrofe 13, transforma as nódoas de vinho em medalhas, as camisas em bandeiras e os suspensórios numa cruz - metáfora do sofrimento de Cristo, na cruz.
Este poema é talvez aquele em que a descrição sensorial do real se torna mais evidente, através do uso de:
O título deste poema poderia ser "Num Bairro Proletário", como contraponto a "Num Bairro Moderno". Enquanto neste último o sujeito poético nos conduz através de um bairro burguês com as suas casas apalaçadas e os seus mordomos, em "Cristalizações", deambulamos por entre "Uns barracões de gente pobrezita / E uns quintalórios velhos com parreiras" que se situam nuns "sítios suburbanos, reles!"
Porém, não é apenas este aspecto que aproxima dois poemas que retratam espaços citadinos tão diametralmente opostos. Também a oposição real / fuga imaginativa está presente nos dois textos.
Tendo em conta esta oposição, é possível delimitar em "Cristalizações" dois níveis narrativos diferentes:
- o do real (estrofes 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20);
- o da imaginação (estrofes 7 - versos 2, 3, 4 - 13).
Com efeito, todo o poema é um hino a estes trabalhadores que abandonaram as lezírias, os montados, as planícies, as montanhas para com "os grossos maços" partirem a pedra "com que outros" fazem a calçada. Trata-se de um trabalho duro, moroso, ininterrupto - "(...) E os rapagões morosos, duros, baços, / Cuja coluna nunca se endireita"; "Homens de carga! Assim as bestas vão curvadas! / Que vida tão custosa!") - realizado ao frio, "nesse rude mês, que não consente as flores", nesse "Dezembro enérgico, sucinto".
De repente, cortando o ritmo de trabalho daqueles homens fortes, rudes - "bovinos, másculos, ossudos" - e brutos - "Como animais comuns", surge uma actrizita com "pezinhos de cabra" cuja presença desassossega aqueles trabalhadores que a encaram "sanguínea, brutamente".
No entanto, "O demonico arrisca-se, atravessa /Covas, entulhos, lamaçais depressa", continuando o seu caminho.
O posicionamento do sujeito poético face aos calceteiros, embora lhes reconheça aspectos quase que animalescos, é de uma empenhada solidariedade bem patente, quando na estrofe 13, transforma as nódoas de vinho em medalhas, as camisas em bandeiras e os suspensórios numa cruz - metáfora do sofrimento de Cristo, na cruz.
Este poema é talvez aquele em que a descrição sensorial do real se torna mais evidente, através do uso de:
- sinestesias - "Vibra uma imensa claridade crua"
- sensações visuais - "E as poças de água, como em chão vidrento, / reflectem a molhada casaria"
- sensações auditivas - "Disseminadas, gritam as peixeiras", "E o ferro e a pedra - que união sonora!"
- sensações tácteis - "Faz frio"
- sensações olfactivas "Cheira-me a fogo, a sílex, a ferrugem"
- sensações gustativas - "Sabe-me a campo, a lenha, a agricultura"
- vocabulário expressivo - "O céu renova a tinta corredia"
- metáforas - "E os charcos brilham tanto, que eu diria / Ter ante mim lagoas de brilhantes!"
in Colecção Resumos da Porto Editora
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