segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Análise da cena do Frade

Auto da Barca do Inferno


Antes de dar por finda a abordagem, que tenho vindo a fazer, sobre o Auto da Barca do Inferno, decidi analisar profundamente uma das cenas.


Cena do Frade


O Frade surge no cais cantando e dançando com uma moça (Florença) com quem vivera maritalmente. Esta cena é uma caricatura da devassidão do clero da época – este frade canta, dança, pratica esgrima, tem uma “namorada”, passa mais tempo na corte do que no convento a rezar – como todos os outros do seu convento “E eles fazem outro tanto”.

Alegre, cantante e bom dançarino, o frade veste-se com as tradicionais roupas sacerdotais e sob elas, instrumentos e roupas usadas pelos praticantes de esgrima, desporto esse em que ele se revela muito hábil. O Frade indigna-se quando o Diabo o convida a entrar na sua barca, pois acredita que os seus pecados deveriam ser perdoados, uma vez que ele foi um representante da religião. Então ele, sempre acompanhado pela amante, segue até ao batel da glória e o Anjo nem sequer lhe dirige a palavra, tal é a sua reprovação, cabendo ao Parvo o papel de condenar o Frade à barca do Inferno pela sua falsa moralidade religiosa.


1. Personagens

1.1. Papel e função


O Frade – protagonista (papel)

réu e advogado de defesa (função)

O Diabo e o Anjo – personagens principais (papel)

advogados de acusação e juízes (função)


A moça – figurante: elemento de prova (ajudará à condenação do Frade, simboliza a vida pecaminosa levada pelo Frade. Florença no final também embarcará no batel do Diabo, porque também ela pecou, pois sabia que não podia viver maritalmente com um padre.)



2. Caracterização do Frade


O Frade apresenta-se ao Diabo dizendo “Deo gratias! Som cortesão.”. esta personagem é muito bem caracterizada pelo Diabo e pelo Joane (que nesta cena toma o lugar do Anjo, porque este não considera o Frade digno que ele lhe dirija sequer a palavra) e por si próprio.



2.1. Caracterização Directa

2.1.1. Autocaracterização:


“Deo gratias! Som cortesão.” (Esta apresentação feita pela própria personagem é contraditória: “Deo gratias!” - palavras relacionadas com o seu estatuto social – homem da igreja ; “Som cortesão” – ele afirma ter frequentado a corte, tendo tido por isso uma vida mundana, cortesã que não se coaduna com a vida do convento, dos religiosos).

“Eu tangerei / e faremos um serão.” (O Frade além de saber cantar, afirma que também sabe tocar. Cantava-se, tocava-se música e dançava-se nos serões da corte.)

À pergunta do Diabo se a dama que o acompanha lhe pertence, ele responde “Por minha la tenho eu”, acusando-se a si próprio de ter uma amante.

“E este hábito nom me val?” O Frade estava convencido que lhe bastaria vestir um hábito para se ver livre das chamas do Inferno.

“Um padre tão namorado / e tanto dado à virtude” Mais uma contradição na caracterização feita pelo Frade, por um lado afirma que está muito enamorado de Florença, por outro considera-se muito virtuoso.

“Se há um frade de perder /com tanto salmo rezado” Ele rezou tanto durante a sua vida e agora, só por ter uma mulher, será condenado.

“Sabê que fui da pessoa!” O Frade informa o Diabo que foi uma pessoa bastante importante.

“Padre que tal aprendia / no Inferno há-de haver pingos?” esta personagem praticava esgrima na corte e ao demonstrar as suas habilidades de esgrimista ao Diabo, declara que padre com tal sabedoria não poderia ir para o Inferno.



2.1.2. Heterocaracterização

Caracterização feita pelo Diabo:


“gentil padre mundanal,” O Diabo utiliza dois adjectivos contraditórios para caracterizar o Frade: gentil tem a ver com a vida religiosa e mundanal refere-se ao facto de ele ser dado aos prazeres do mundo.

“ Devoto padre marido” Ironicamente, o Diabo diz ao Frade que ele é um padre devoto (muito dado à virtude, o que está de acordo com a vida dos padres), mas também é marido de Florença, mostrando a desconformidade entre os ideais e os actos do Frade, porque este em vez de viver um vida de pobreza, de humildade, de oração, tinha uma mulher.



Caracterização feita pelo Parvo:


O Anjo não atende o Frade, porque sendo este um membro da igreja, deveria saber distinguir o mal do bem e não ter levado uma vida de prazeres, de pecado. Não é pois digno da atenção do Anjo.

“Furtaste o trinchão, frade? O parvo acusa o Frade de ter roubado Florença, porque não é suposto um padre ter mulher, então aquela deveria pertencer a outro homem certamente.



2.2. Caracterização indirecta

a) Os símbolos:

O Frade aparece-nos a cantar e a dançar com a moça Florença pela mão. Traz também consigo os símbolos da sua classe social: o hábito com capelo e a coroa. Carrega ainda os apetrechos que têm a ver com a sua vida mundana, a prática de esgrima: o broquel, a espada e o casco.

Com estes símbolos, Gil Vicente pretende chamar a atenção para os frades libertinos, galantes e sensuais e mundanos: dançarinos e esgrimistas que frequentavam a corte.


b) A linguagem:


- alegre – “Tai-rai-rai-ra-rão,”

- convencido – “Eu hei-de ser condenado?”

- confiante – “Nom ficou isso n´avença”

- presunçoso – “Som cortesão”

- autoritário – “ Há lugar cá / pêra minha reverença? / e a senhora Florença / polo meu entrará lá!”

- resignado – “Vamos onde havemos d´ir,”.



  1. Acusação /Defesa

3.1. Acusação feita pelo Diabo e pelo Parvo


O Diabo acusa o Frade de ter levado uma vida mundana, tendo usufruído dos prazeres da corte: praticava esgrima: “Dê vossa senhoria lição de esgrima”, dançava e cantava: ele surge em cena a cantar e a dançar e mais tarde o Diabo pergunta-lhe se ele sabe também o “tordião” ao que ele responde afirmativamente. É também acusado de ter vivido amancebado, não tendo respeitado o voto de castidade imposto aos membros sacerdotais: ”E essa dama é ela vossa? / por minha la tenho eu…”. Seguidamente pergunta-lhe também o Arrais do Inferno: “E não vos punham lá grosa / no vosso convento santo?” O Diabo ao fazer esta pergunta pretende obter uma resposta condenatória do Frade, levando-o a não só a acusar-se a si mesmo, como a todos os que vivem no convento, toda a classe social, o clero. Ironicamente, o Diabo continua a acusar o Frade, apelidando-o de “gentil padre mundanal”, “ Devoto padre marido”, querendo acusá-lo da vida “dupla” que levava (um padre não pode viver maritalmente com uma mulher, nem ter uma vida mundana).

O Parvo acusa e condena o Frade ao Inferno, dizendo-lhe “Furtaste o trinchão, frade?”, referindo-se ao pecado mais grave do Frade, segundo a sua opinião.



3.2. Defesa do Frade


O Frade defende-se, muitas vezes reforçando as acusações feitas pelo Diabo: “Deo gratias! Som cortesão.”: apresentando-se desta maneira o Frade refere a sua vida cortesã.

“E eles fazem outro tanto!”: é esta a resposta do Frade ao Diabo ao tentar justificar o facto de ter uma amante (todos os padres do seu convento faziam o mesmo, condena-se a si e a todo o clero com esta desculpa).

“E este hábito nom me val?”: o Frade pensa ter salvação por ser um membro da igreja.

“Um padre tão namorado / e tanto dado à virtude”: a personagem ao tentar defender-se, ainda se “enterra” mais – ele poderia ter sido uma pessoa virtuosa, mas nunca poderia estar enamorado.

“Se há um frade de perder /com tanto salmo rezado”: mais uma vez, depois de o Diabo lhe apontar o seu destino, o Inferno, o Frade defende-se, não concordando, pois rezou tanto e agora só por ter uma mulher, é condenado às penas do Inferno.

“Sabê que fui da pessoa!”: ele apresenta como defesa o facto de ter sido, na vida terrena, uma pessoa importante, logo não poderia ser condenado.

“Padre que tal aprendia / no Inferno há-de haver pingos?”: Enquanto dá a lição de esgrima tenta mais uma vez a sua defesa, apresentando agora o facto de ser um bom desportista.



4. Composição e Formulação


Personagem criada por Gil Vicente, o Frade ao representar a classe social a que pertence – clero – traz em si todos os defeitos desta classe que são condenáveis pela justiça divina.

Verificamos que o protagonista evolui em cena, movimentando-se, mas não se nota que haja uma evolução psicológica, logo podemos classificá-lo como personagem plana.

Para além disso, o Frade surge em cena acompanhado de elementos que caracterizariam qualquer Frade, utilizando uma linguagem que qualquer outro elemento da sua classe social poderia usar. O Frade, respondendo ao Diabo “E eles fazem outro tanto”, condena toda a sua classe social, já que pretende dizer que no seu convento muitos frades levam o mesmo tipo de vida que ele levava. O Frade é, portanto, não o representante de si mesmo, mas uma personagem-tipo.

O Anjo e o Diabo são personagens alegóricas, porque representam conceitos: o bem e o mal.



5. Percurso Cénico


Frade

Cais ----- Barca do Inferno ----- Barca do Anjo ----- Barca do Inferno ----- Embarca


O Frade chega ao cais, dirige-se à Barca do Inferno, onde dialoga com o Diabo (1.º momento - exposição). Não lhe agradando a conversa do Diabo nem o destino daquela barca, tenta a sua sorte junto do Anjo, na Barca do Paraíso (2.º momento - conflito). Este recusa a sua entrada na sua barca e o Frade regressa à Barca do Inferno, onde embarca (3.º momento - desenlace).



6. A Linguagem e o Estilo


Nível de língua


- corrente – no geral do texto

- gíria – tecnicismos utilizados na lição de esgrima dada pelo Frade ao Diabo – vocábulos relacionados com a esgrima.


Recursos estilísticos (exemplos)


- Ironia – “no vosso convento santo?”

- Eufemismo- “Pêra aquele fogo ardente”

- Comparação – “Aqui estou tão bem guardado / como a palha n´albarda.”

- Anáfora – “Pera onde levais gente? / Pera aquele fogo ardente”

- Interjeição – “Oh”, “Houlá!”

- Imperativo – “Entrai, padre reverendo!”

- Metáfora – “Mantenha Deus esta coroa / Ó padre Frei capacete”

- Antítese – “Devoto padre marido” (também é ironia)

- Adjectivação anteposta e posposta – “Gentil padre mundanal” (também é ironia)



7. Cómicos


De Situação – O Frade aparece a cantar e a dançar com a moça pela mão e quando dá a lição de esgrima ao Diabo (imagine-se um frade de hábito e todo “artilhado” a dar uma lição de esgrima ou um frade feliz e contente, a dançar e a cantar com a sua amante pela mão).


De Linguagem – a ironia empregue pelo Diabo no diálogo com o Frade.


De carácter – o Frade esgrimista, dançarino e namorado, convencido de que a simples condição de sacerdote o salvava.



8. A intenção do autor


Gil Vicente pretende criticar e moralizar a sociedade do seu tempo, hierarquizada em clero, nobreza, burguesia e povo.

Gil Vicente criou, no espaço alegórico da margem do rio que se tem de atravessar rumo ao destino post-mortem, um pretexto para criticar a sociedade, através de várias personagens representativas de classes ou grupos (tipos), da ironia e do cómico.

Nesta cena, Gil Vicente criticou severamente os frades que levavam uma vida de pecado, não cumprindo o voto de castidade a que haviam sido obrigados quando decidiram enveredar pela vida religiosa.

As barcas simbolizam a salvação (Barca do Anjo) e o castigo, a condenação ao fogo do Inferno (Barca do Diabo).

Gil Vicente acreditava que se as pessoas da sua época vissem os seus vícios retratados, representados, poderiam emendar-se. A honestidade, a simplicidade, o cumprimento dos preceitos religiosos em conformidade com uma vida digna, levaria as pessoas ao paraíso. Já o contrário: desonestidade, corrupção, roubo, falsidade, feitiçaria, desprezo pelas classes inferiores, vaidade, presunção… eram vícios condenáveis e castigados pela justiça divina.



Ter dúvidas é saber…



- Que fala-barato me saíram!

- Ó professora, não é falas-baratos no plural?

- Não, não é!


O plural de fala-barato é igual ao singular: Ele é um fala-barato. Eles são uns fala-barato.

E no feminino é assim: Ela é uma fala-barato. Elas são umas fala-barato.


Portanto, ficam a saber que fala-barato é um nome invariável quanto ao género e ao número.






Venho partilhar convosco um miminho que recebi desta menina. Este selo consiste em dizer sete coisas que amamos e repassar a sete meninas:

1. Os meus filhos
2. Os meus pais

3. O meu marido

4. O Gil e a Nina
5. Saúde
6. Paz
7. Artes

Agora repasso a todas as meninas que ainda não têm este belo miminho....
fiquem bem!




A Mena na cozinha


Puré com curgete


puré de batata congelado ou em flocos

leite

sal

pimenta

1 curgete

azeite


Comece por ralar a curgete.

Leve ao lume a curgete com duas ou três colheres de sopa de azeite.

Quando a curgete estiver cozida, reserve.

Faça o puré (em flocos) de acordo com as instruções, mas não ponha a margarina. pois a curgete já tem azeite. Se utilizar puré congelado, coloque-o num tacho e junte 0,5 l de leite.

Misture a curgete e mexa bem. Tempere com sal e pimenta.








Costumo fazer este puré para acompanhar isto.

Bom apetite!





Trabalhinhos:


Lençol com arte aplicada e bordado feito pela minha mãe.

Sabonete

Vela

6 comentários:

mafgonbot@gmail.com disse...

Olá querida,

gostei muito dos trabalhos, estão todos muito bonitos!!
Boa semana.
Beijocas
Mafalda

artes_romao disse...

Boa tarde,td bem?
adorei as ultimas novidades....
esta td um mimo,parabens.
fika bem,jinhos***

Brunette disse...

Olá!
Passei para agradecer o comentário e desejar uma boa semana.
Gostei muito dos trabalhos aqui publicados, nota-se que o talento está de mãos dadas com a dedicação.
Em relação à receita, dá vontade de experimentar, o aspecto está mesmo apetitoso!
Continuação de bom trabalho!

mfc disse...

Apreciei muito a máxima... "ter dúvidas é saber!"
... e adoro courgettes!

Nile e Richard disse...

Oi amiga.Gostei da Barca do inferno.As análizes sobre os textos estão formidáveis.Mas sinceramente nos tempos de hoje quem condenatia o Padre??Eu é que não pois hoje está tudo moderno até os 10 mandamentos foram atualizados.Mas antigamente acho que até seriam capaz de linchar os dois pecadores.
gostei da sua cozinha,gosto de courgetts.Os seus trabalhos estão maravilhosos.bjtos.Nile.

isabel tiago disse...

Boa noite Mena

Obrigada pela visita. Tenho visitado o seu blog mas não sei porquê não encontrava a linha para comentar. Provavelmente já não estava a ver bem.
Eu e o teatro, em especial este género, não temos grande relação. É trauma de infância. Passavem imenso teatro na televisão quando eu era pequena e isso, de alguma maneira desencantou-me. Depois andei na escola e demos alguma matéria idêntica e também não consegui gostar. Não sei se o defeito era meu....
No que respeita aos seus cozinhados recomendam-se. Muita inovação, em especial no uso de vegetais menos comuns há uns.
O trabalhinho da mãe, sempre bonito e agradável de ver. Quem tem mãe tem tudo.
Falando agora do assunto da Padroeira, acredite que foi um tema dado ne escola de que me recordo com alguns dos pormenores e então lembrei-me de pesquisar, encontrei este resumo com autor, que achei bastante preciso e não muito longo, uma foto da imagem, também de um outro autor e está feita a notícia com dois destaques: A construção do Mosteiro da Batalha e a do Convento do Carmo por decisão de Nuno Álvares Pereira.