quinta-feira, 31 de março de 2011

Brincar com a lua

Tirei estas fotos no dia 19 de Março, o dia da "Lua Maior".


Lua Adversa



Tenho fases, como a lua,
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e que vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.

E roda a melancolia
seu interminável fuso!

Não me encontro com ninguém
(tenho fases, como a lua...).
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...

Cecília Meireles







As fotos que se seguem são do fotógrafo profissional e jornalista científico, Laurent Laveder que criou a série Moon Games, composta por diversas imagens que mostram pessoas interagindo com a Lua.

Capturando as cenas por um ângulo específico, o artista faz parecer que o satélite está realmente ao alcance das mãos dos homens e mulheres que, posando para as lentes do artista, brincam de jogá-lo para cima, ou pousá-lo na xícara de café.

Especializado em fotos do céu, Laveder faz parte do coletivo The World At Night, que reúne 30 dos melhores astrofotógrafos do planeta.













Vejam por onde anda o nosso dinheirinho!

Estudo do Economista Álvaro Santos Pereira, Professor da Simon Fraser University, no Canadá. *

Portugal tem hoje 349 Institutos Públicos, dos quais 111 não pertencem ao sector da Educação. Se descontarmos também os sectores da Saúde e da Segurança Social, restam ainda 45 Institutos com as mais diversas funções.

Há ainda a contabilizar perto de 600 organismos públicos, incluindo Direcções Gerais e Regionais, Observatórios, Fundos diversos, Governos Civis, etc.) cujas despesas podiam e deviam ser reduzidas, ou em alternativa - que parece ser mais sensato - os mesmos serem pura e simplesmente extintos.

Para se ter uma noção do despesismo do Estado, atentemos apenas nos supra-citados Institutos, com funções diversas, muitos dos quais nem se percebe bem para o que servem.

Veja-se então as transferências feitas em 2010 pelo governo para estes organismos:

ORGANISMOS

DESPESA (em milhões de €)

Cinemateca Portuguesa

3,9

Instituto Português de Acreditação

4,0

Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos

6,4

Administração da Região Hidrográfica do Alentejo

7,2

Instituto de Infra Estruturas Rodoviárias

7,4

Instituto Português de Qualidade

7,7

Administração da Região Hidrográfica do Norte

8,6

Administração da Região Hidrográfica do Centro

9,4

Instituto Hidrográfico

10,1

Instituto do Vinho do Douro

10,3

Instituto da Vinha e do Vinho

11,5

Instituto Nacional da Administração

11,5

Alto Comissariado para o Diálogo Intercultural

12,3

Instituto da Construção e do Imobiliário

12,4

Instituto da Propriedade Industrial

14,0

Instituto de Cinema e Audiovisual

16,0

Instituto Financeiro para o Desenvolvimento Regional

18,4

Administração da Região Hidrográfica do Algarve

18,9

Fundo para as Relações Internacionais

21,0

Instituto de Gestão do Património Arquitectónico

21,9

Instituto dos Museus

22,7

Administração da Região Hidrográfica do Tejo

23,4

Instituto de Medicina Legal

27,5

Instituto de Conservação da Natureza

28,2

Laboratório Nacional de Energia e Geologia

28,4

Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu

28,6

Instituto de Gestão da Tesouraria e Crédito Público

32,2

Laboratório Militar de Produtos Farmacêuticos

32,2

Instituto de Informática

33,1

Instituto Nacional de Aviação Civil

44,4

Instituto Camões

45,7

Agência para a Modernização Administrativa

49,4

Instituto Nacional de Recursos Biológicos

50,7

Instituto Portuário e de Transportes Marítimos

65,5

Instituto de Desporto de Portugal

79,6

Instituto de Mobilidade e dos Transportes Terrestres

89,7

Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana

328,5

Instituto do Turismo de Portugal

340,6

Inst. Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação

589,6

Instituto de Gestão Financeira

804,9

Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas

920,6

Instituto de Emprego e Formação Profissional

1.119,9

TOTAL.........................

5.018,4

- Se se reduzissem em 20% as despesas com estes - e apenas estes - organismos, as poupanças rondariam os 1000 milhões de €, e evitava-se a subida do IVA.

- Se fossem feitas fusões, extinções ou reduções mais drásticas a poupança seria da ordem dos 4000 milhões de €, e não seriam necessários cortes nos salários.

- Se para além disso, em outros tantos Institutos se procedesse de igual forma, o PEC 3 não teria tido sequer razão de existir, muito menos o 4 e...


quarta-feira, 30 de março de 2011

A escrita


A escrita é a minha primeira morada de silêncio

a segunda irrompe do corpo movendo-se por trás das palavras

extensas praias vazias onde o mar nunca chegou

deserto onde os dedos murmuram o último crime

escrever-te continuamente... areia e mais areia

construindo no sangue altíssimas paredes de nada

esta paixão pelos objectos que guardaste

esta pele-memória exalando não sei que desastre

a língua de limos

espalhávamos sementes de cicuta pelo nevoeiro dos sonhos

as manhãs chegavam como um gemido estelar

e eu perseguia teu rasto de esperma à beira-mar


outros corpos de salsugem atravessam o silêncio

desta morada erguida na precária saliva do crepúsculo


Al BertoEsta é a minha agenda, fi-la para mim!

terça-feira, 29 de março de 2011

Ficha de leitura d'Os Maias - Acção

5.



Ficha de leitura de Os Maias

1. Acção (intriga)

1.1. Acções secundárias

Numa tentativa de se explicar os antecedentes familiares de Carlos, em analepse (recuo no tempo) iniciado logo depois das primeiras oito páginas (“esta existência nem sempre assim correra…”), são-nos dadas breves referências à existência tranquila de Caetano da Maia, sob padrões do absolutismo vigente, a juventude movimentada de Afonso guiado pelas ideias liberais, e é-nos narrada a história de Pedro da Maia (sua educação tradicional e seus amores trágicos com Maria Monforte). Esta síntese histórica de três gerações da família Maia é-nos dada em narrativa de ritmo acelerado, com predomínio do pretérito perfeito. As funções cardinais ou núcleos desta intriga relativa a Pedro da Maia são (segundo Carlos Reis):

F1 - Pedro da Maia vê Maria Monforte (p. 22);

F2 - Pedro namora Maria Monforte (p. 26);

F3 - Pedro casa com Maria Monforte (p. 30);

F4 - Maria Monforte foge (p. 44);

F5 - Pedro suicida-se (p. 52).

Esta pequena intriga de que Pedro da Maia é protagonista, com insistência sobre a sua educação, sobre o temperamento doentio da mãe Maria Eduarda Runa e sobre as suas próprias tendências românticas, funciona como um precedente familiar explicativo (indícios) de muita coisa que se passará na vida de Carlos e de Maria Eduarda. Esta intriga secundária d’Os Maias está, pois, para a intriga central como a causa está para o efeito. Neste particular, este romance segue a técnica naturalista (positivista): dadas determinadas causas, seguem-se infalivelmente determinados efeitos (determinismo hereditário). Esta intriga secundária (de Pedro) existe, pois, em função da intriga central (de Carlos).

6.


1.2. Acção central

A intriga central (do capítulo III até ao fim) apresenta a história dos Maias a partir do Outono de 1875, quando a família se encontrava “reduzida a dois varões, o senhor da casa, Afonso da Maia, um velho já, quase um antepassado, mais idoso do que o século, e seu neto Carlos”, centrando-se sobretudo nos amores trágicos de Carlos e Maria Eduarda.

São estas as funções cardinais ou núcleos da intriga principal:

F1 - Carlos da Maia vê Maria Eduarda (p. 156);

F2 - Carlos visita Rosa (p. 257);

F3 - Carlos conhece Maria Eduarda (p. 350);

F4 - declaração de Carlos (p. 409);

F5 - consumação do incesto (p.438);

F6 - encontro de Maria Eduarda com Guimarães (p. 537);

F7 - revelações de Guimarães a Ega (p. 615);

F8 - revelações de Ega a Carlos (p. 640);

F9 - revelações de Carlos a Afonso (p. 645);

F10 - incesto consciente (p. 658);

F11 - encontro de Carlos com Afonso (p. 667);

F12 - morte de Afonso (p. 668);

F13 - revelações a Maria Eduarda (p. 683);

F14 - partida de Maria Eduarda (p. 687).

Poderíamos reduzir estes núcleos aos momentos mais dinâmicos da narrativa, isto é, aos pontos fundamentais da intriga:

F1 - Carlos da Maia vê Maria Eduarda;

F2 - Carlos conhece Maria Eduarda;

F3 - declaração de Carlos;

F4 - consumação do incesto;

F5 – revelação

F6 – separação de Carlos e Maria Eduarda.

Já dentro da intriga central há outras acções secundárias: episódio romântico de Carlos com a mulher do empregado do Governo Civil de Coimbra (cap. IV); ligações com a espanhola Encarnacion, que trouxera de Lisboa para Coimbra (cap. IV); ligações adúlteras de Carlos com a condessa de Gouvarinho (caps. V, VI, VII, X, XI, XII, XIII); relações adúlteras de João da Ega com Raquel Cohen (caps. IV, V, VI); a história de Eusebiozinho, molengão e tristonho, da sua educação sob as saias da mãe, do fracasso do seu segundo casamento, pois, no dizer de Ega, era “derreado à pancada pela mulher” (caps. III, IV, VII); a sequência da Corneta do Diabo em que aparece um artigo injurioso contra Carlos da responsabilidade de Dâmaso, conseguindo Ega evitar a sua divulgação (cap. XV).

As acções secundárias assinaladas têm uma certa ligação com a acção central, mesmo parecendo, à primeira vista, que não. Assim, essas episódicas e superficiais relações amorosas de Carlos têm a função de realçar, por um processo antitético, o profundo amor existente na relação Carlos/Maria Eduarda. A educação de Eusebiozinho, tal como a de Pedro da Maia, serve de contraponto à educação moderna, de tipo inglês, que Afonso da Maia fizera ministrar ao seu neto Carlos. Mais estreita é ainda a ligação entre o episódio da Corneta do Diabo e a linha central do romance. Com efeito, a ligação amorosa Carlos/Maria Eduarda vinha frustrar as aspirações de Dâmaso, pelo que este faz publicar o artigo. Além disso é a carta vergonhosa que Ega faz escrever a Dâmaso (em consequência do artigo) que provoca o encontro daquele com Guimarães, o qual, como destinador, revelará o fatídico segredo que desencadeará a tragédia.

A Intriga Central desenvolve-se num ritmo extraordinariamente lento, devido não só às acções secundárias inseridas por alternância na acção central, mas também e sobretudo aos longos episódios mais descritivos do que narrativos, de crítica social. Estes quadros, ou frescos, sendo momentos de pausa ou catálises, travam o ritmo da narrativa, pois são momentos estáticos em que personagens e tipos sociais se exibem demoradamente.

Destaquemos os seguintes episódios de crítica social: o jantar no Hotel Central, (cap. VI), as corridas no hipódromo (cap. X), o jantar na casa dos Gouvarinhos (cap. XVI), o passeio pela baixa lisboeta (cap. XVIII) em que Carlos e Ega comentam com pessimismo o passado das suas vidas e os males da sociedade portuguesa.

Note-se que também estes quadros de crítica social têm pontos de contacto com a acção central. Em todos eles, intervém o protagonista Carlos e é fácil de ver certas motivações relacionadas com a sua paixão por Maria Eduarda. Por exemplo, foi às corridas para ver Maria Eduarda e foi no fim do espectáculo que recebeu uma carta dela. No pessimismo de Carlos e Ega, no episódio final, paira ainda a sombra, embora já longínqua, da tragédia do amor incestuoso.

De notar que se dá nesse último episódio como que a fusão do plano da tragédia (intriga) com o plano da comédia (crítica de costumes). Assim, se compreende que Carlos tenha conservado, até ao eclodir da tragédia, uma certa dignidade e venha agora a cair num certo ridículo quando, ao mesmo tempo que corria juntamente com Ega para apanhar o americano, repetia que não correria para nada deste mundo.

Há, portanto, n’ Os Maias dois planos que só não dizemos paralelos porque se tocam em vários pontos: o plano da intriga (plano da tragédia) e o plano da crítica de costumes (plano da comédia).

7.




1.3. Dimensão trágica d’ Os Maias

A intriga central d’ Os Maias é dotada das características fundamentais da tragédia clássica:

a) O tema do incesto é próprio da tragédia, pois é em si de grande impacto emocional por ser uma ocorrência anormal e pela impossibilidade de solução do conflito por ele provocado. Ele é, por exemplo, o tema fulcral da tragédia de Sófocles, O Rei Édipo.

b) É importante a acção do DESTINO que se manifesta, por exemplo, no facto de Maria Monforte ter escolhido para nome de seu filho Carlos Eduardo (carlos Eduardo Stuart foi o último dos Stuarts, o fim de uma família); na afirmação de Ega a respeito de Carlos e Maria Eduarda “ambos insensivelmente, irresistivelmente, fatalmente, estão marchando um para o outro” (de notar a força invencível do destino expressa pelos advérbios de modo); na referência a Afonso da Maia, já perto do desfecho fatal, “Mas o velho afastou-se, todo dobrado sobre a bengala, vencido enfim por aquele implacável destino que, depois de o ter ferido na idade da força com a desgraça do filho, o esmagava ao fim da velhice com a desgraça de neto”; no aparecimento casual de Guimarães (a força motora do destinador no momento das fatídicas revelações).

c) São inúmeros os PRESSÁGIOS ou indícios:

· Quando o procurador Vilaça pretendia dissuadir Afonso de vir habitar o Ramalhete: “…por fim aludia mesmo a uma lenda, segundo a qual eram sempre fatais aos Maias as paredes do Ramalhete”.

· Afonso da Maia, ao ver Maria Monforte pela primeira vez junto de Pedro: “Maria, abrigada sob uma sombrinha escarlate, trazia um vestido cor-de-rosa, toda em folhos, quase cobria os joelhos de Pedro… Afonso (…) olhava cabisbaixo aquela sombrinha escarlate que agora se inclinava sobre Pedro, quase o escondia, parecia envolvê-lo todo, como uma larga mancha de sangue alastrando a caleche…” (note-se como todo este envolvimento vermelho prenuncia a morte trágica de Pedro).

· Ega, embora com uma certa ironia, avisava Carlos envolvido no grande amor: “…hás-de vir a acabar, desgraçadamente como ele (Pedro) numa tragédia infernal…”

· Depois de Carlos ter ganhado no jogo, durante as corridas, a “vasta ministrada da Baviera” disse-lhe: mefiez-vous! (sorte no jogo…).

· Carlos achava que Maria Eduarda era psicologicamente parecida com o avô (“e nestas piedades Carlos achava-lhe semelhanças com o avô”); Maria Eduarda, por seu lado, considerava Carlos parecido fisionomicamente com sua mãe (“é extraordinário, mas é verdade, pareces-te com minha mãe!”).

· O narrador, ao descrever o quarto em que se consumaria o incesto: “o leito (…) bordado a flores de oiro, (…) enchia a alcova, esplêndido e severo, e como erguido para as voluptuosidades grandiosas de uma paixão trágica…).

d) A intriga é dotada dos ingredientes fundamentais da tragédia clássica:

· PERIPÉCIAS, sobretudo a peripécia fundamental, aquela que provoca “a súbita mutação dos sucessos”, isto é, as revelações casuais de Guimarães a Ega, quando, ao entregar-lhe o “cofrezinho”, lhe disse: “…entrega-o da minha parte a Carlos ou à irmã”.

· RECONHECIMENTO, ou anagnórise, que corresponde ao conhecer”, isto é, ficam a saber que são irmãos. O reconhecimento coincide com o clímax, ou ponto mais alto da emoção dramática.

· CATÁSTROFE, que se segue logicamente ao reconhecimento e que consiste na morte de Afonso e na separação de Carlos e Maria Eduarda.

e) As PERSONAGENS que intervêm directamente na intriga trágica são NOBRES e conservam sempre uma certa dignidade até acabar a acção trágica.

Note-se que, mesmo nos primeiros amores, episódicos, de Carlos, nunca esta personagem caiu no ridículo: foi sempre ele que tomou a iniciativa de cortar com essas ligações, por motivos de humanidade, ou de honra.

Carlos, assim como Maria Eduarda, só foram recuperados para o mundo da comédia, quando deixaram de ser personagens da tragédia. Por exemplo, quando Carlos, no episódio final, corria para o americano, ao mesmo tempo que repetia que não correria nem para um monte de oiro, já era uma personagem de comédia.


8.