segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Auto-retrato

Escrita Intimista e Autobiográfica



O (auto)-retrato


A escrita intimista e autobiográfica é aquela em cujo acto de escrita o sujeito se reflecte e reflecte sobre si mesmo.

O auto-retrato, a autobiografia, os poemas autobiográficos, o diário, as cartas, as memórias, são exemplos de textos de carácter autobiográfico.

No auto-retrato encontramos um eu que se olha, que se descobre no espelho de Narciso (Narciso: O mito fundador da representação do eu) e que se apresenta a si próprio. O auto-retrato é, pois, o retrato de uma pessoa feito por ela própria.



O Mito de Narciso


O mito de Narciso é frequentemente evocado a propósito da escrita autobiográfica. Narciso é o ser que se contempla na água e que se apaixona pela sua própria imagem reflectida. Ora, a representação do eu enquanto reflexo de mim, lembra-nos que este mesmo eu é um ser duplo: o ser que se contempla – sujeito – representa a identidade, o mesmo, e consequentemente a procura de reconhecimento e o ser que é contemplado – objecto – representa o outro e consequentemente a procura do conhecimento. Isto significa que na escrita autobiográfica encontramos um eu que se identifica e se reconhece como esse mesmo eu (o ser de carne e osso), mas também um eu que se desdobra em outros à medida que se vai reconstruindo e auto conhecendo na própria escrita (o ser de papel).



Auto-retrato


A palavra “auto-retrato”, composta por justaposição, é constituída pelo radical auto- (do grego autós = próprio, de si mesmo), empregue com o seu valor originário. No entanto, este radical ganhou um outro sentido nas línguas modernas como forma abreviada de automóvel (= veículo movido por si mesmo). Assim, observamos que:


auto- :


- radical que exprime a noção de próprio em vocábulos como autobiografia, autocrítica, auto-avaliação, auto-apresentação;

- radical que exprime a noção de automóvel em vocábulos como autódromo, auto-estrada, autocarro.


Com hífen ou sem hífen?

As palavras iniciadas por auto- grafam-se com hífen apenas quando o segundo elemento tem vida própria e começa por:

- vogal, h-, r- ou s-: ex.: auto-estima / auto-hemoterapia / auto-retrato / auto-sugestão.



Fazendo uma análise de vários auto-retratos, podemos verificar que são assumidas diferentes perspectivas. Assim sendo, podemos observar:


-um tipo de registo objectivo/subjectivo;

Numa descrição objectiva, a reprodução da personagem em causa é fiel, isto é, os aspectos caracterizados são descritos de acordo com a realidade. Pelo contrário, numa descrição mais subjectiva, a personagem é descrita de acordo com a sensibilidade do observador, isto é, da maneira como este a vê e sente.


- uma perspectiva geral/pormenorizada;

A personagem descrita numa perspectiva geral é apresentada, globalmente, através dos seus traços dominantes. Em contrapartida, a personagem descrita numa perspectiva mais pormenorizada é apresentada a partir dos seus traços particulares distintivos, relativos ao aspecto físico, aos sentimentos e ao comportamento desta.


- uma perspectiva fixa/móvel;

A caracterização de uma personagem pode ser feita numa perspectiva fixa e estática como se estivéssemos a ver uma fotografia ou, pelo contrário, numa perspectiva mais dinâmica como se estivéssemos a assistir a um filme. Estas duas perspectivas dependem da presença/ ausência de movimento. No caso do auto-retrato recriado através de uma imagem, o movimento é reconhecível, por exemplo, a partir dos gestos da personagem e, no caso da descrição verbal do auto-retrato, este é conseguido, por exemplo, a partir dos verbos de acção (movimento).


- a selecção de características físicas, psicológicas, intelectuais ou emocionais.

Caracterizar uma personagem consiste em descrever as suas qualidades físicas, psicológicas, intelectuais e emocionais.


- os diferentes aspectos ou partes seleccionados e evidenciados;

Os aspectos físicos, psicológicos, intelectuais e emocionais seleccionados são, por sua vez, caracterizados a partir da utilização de um vocabulário sugestivo e associando as características da personagem a construções comparativas e metafóricas.



Auto-retrato de Bocage/Auto-retrato de Alexandre O’Neill


O Auto-retrato de Alexande O’Neill é um pastiche (Imitação ou decalque de uma obra literária ou artística) humorístico do auto-retrato de Bocage.



Magro, de olhos azuis, carão moreno,

Bem servido de pés, meão na altura,

Triste de facha, o mesmo de figura,

Nariz alto no meio, e não pequeno;


Incapaz de assistir num só terreno,

Mais propenso ao furor do que à ternura

Bebendo em níveas mãos por taça escura

De zelos infernais letal veneno;


Devoto incensador de mil deidades

(Digo, de moças mil) num só momento

E somente no altar amando os frades,


Eis Bocage, em quem luz algum talento;

Saíram dele mesmo estas verdades,

Num dia em que se achou mais pachorrento.


Bocage




Auto-retrato


O’Neill (Alexandre), moreno português,

cabelo asa de corvo; da angústia da cara,

nariguete que sobrepuja de través

a ferida desdenhosa e não cicatrizada.

Se a visagem de tal sujeito é o que vês

(omita-se o olho triste e a testa iluminada)

o retrato moral também tem os seus quês

(aqui, uma pequena frase censurada...)

No amor? No amor crê (ou não fosse ele O’Neill!)

e tem a veleidade de o saber fazer

(pois amor não há feito) das maneiras mil

que são a semovente estátua do prazer.

Mas sofre de ternura, bebe de mais e ri-se

do que neste soneto sobre si mesmo disse...


Alexandre O’Neill



As semelhanças entre os auto-retratos de Bocage e Alexandre O’Neill



Caracterização física dos sujeitos poéticos


Bocage – magro, olhos azuis, carão moreno, bem servido de pés, meão na altura,

nariz alto no meio, e não pequeno, níveas mãos.


O’ Neill – moreno, cabelo de asa de corvo, nariguete que sobrepuja de través, a ferida desdenhosa e não cicatrizada.


Os dois auto-retratos têm traços físicos em comum, dando-se maior destaque à cara e ao tamanho do nariz dos sujeitos poéticos. O aumentativo “carão” no poema de Bocage e a referência a uma “ferida desdenhosa” em O’ Neill, remetem para a pouca beleza de ambos.


Entre os poemas existe também uma clara analogia na selecção do vocabulário.

Por um lado, existem vocábulos iguais em ambos os poemas, tais como "moreno", "ternura" e "amor" e, por outro, existem outros vocábulos e expressões que, apesar de não serem iguais, remetem para uma mesma ideia:


- facha (Bocage) / visagem (O’ Neill) - face do sujeito poético

- luz algum talento (Bocage) / testa iluminada (O’ Neill) – talento do sujeito poético

- saíram dele mesmo estas verdades (Bocage) / ri-se do que (...) sobre si mesmo disse (O’ Neill) – autenticidade / falta de autenticidade do sujeito poético

- nariz alto (..) e não pequeno (Bocage) / nariguete que sobrepuja de través (O’ Neill) – tamanho do nariz



De salientar também na presença de traços de subjectividade através da ironia e do traço caricatural:


Carão (v. 1 Auto-retrato de Bocage)

Bem servido de pés (v. 2 Auto-retrato de Bocage)

e ri-se/ que neste soneto sobre si mesmo disse (vv. 13-14 Auto-retrato de O'Neill)

e não pequeno (v. 4 Auto-retrato de Bocage)

Eis Bocage, (v. 12 Auto-retrato de Bocage)

nariguete (v. 3 Auto-retrato de O'Neill)

que sobrepuja de través (v. 3 Auto-retrato de O'Neill)

(omita-se o olho triste e a testa iluminada) (v. 6 Auto-retrato de O'Neill)



As diferenças entre os auto-retratos de Bocage e Alexandre O’Neill


Caracterização psicológica dos sujeitos poéticos



Auto-retrato de Bocage


“Incapaz de assitir num só terreno” = impetuoso

“Bebendo em níveas mãos por taça escura/

De zelos infernais letal veneno” = ciumento

“Devoto incensador de mil deidades” = apaixonado

“E somente no altar amando os frades” = anticlerical



Auto-retrato de Alexandre O'Neill


"(...) da angústia da cara,(...)

omita-se o olho triste (...)" = amargurado

"o retrato moral também tem os seus quês" = falível

" (...) No amor crê (...)e /

Mas sofre de ternura (...)" = afectuoso



Ambos os sujeitos poéticos se sentem tristes e consideram ter os “seus quês” a nível moral (notar o vocábulo “também”, no poema de O’ Neill, que estabelece uma comparação entre os defeitos dos traços físicos e os defeitos dos traços morais do sujeito poético). Contudo, têm uma atitude diferente em relação ao amor, pois o temperamento arrebatado do sujeito poético do auto-retrato de Bocage (inconstante no amor) “Mais propenso ao furor do que à ternura” difere da posição do sujeito poético do poema de O’ Neill que crê no amor, deseja saber amar, mas “sofre de ternura”.


Se Bocage pretende responder à pergunta “Quem é Bocage?”, a O’ Neill interessa o jogo literário expresso na questão “Como escreve O’ Neill?”.


No soneto de Bocage, as expressões “eis Bocage” e “estas verdades” designam tudo o que ele próprio disse, num tom conclusivo, acerca de si e conferem autenticidade e veracidade ao auto-retrato.


Em contrapartida, no poema de O’Neill é a conjunção coordenativa adversativa “mas” que vem estabelecer esse tom conclusivo, só que aqui não há qualquer alusão à sinceridade; antes pelo contrário, essa sinceridade é substituída pelo riso e pelo desdizer (“Mas sofre de ternura, bebe de mais e ri-se/do que neste soneto sobre si mesmo disse... ”).

Por isso, no poema de O’Neill não se pode falar em sinceridade, ao contrário do que se passa no auto-retrato de Bocage.



Comparação entre os auto-retratos de Bocage e Alexandre O’Neill


a) Os dois poemas têm o mesmo tipo de registo enumerativo, no entanto existem algumas diferenças:

- Em ambos os poemas se evita a repetição dos verbos copulativos. No auto-retrato de Bocage predomina a coordenação assindética (vírgulas a separar as várias orações) e no Auto-retrato de Alexandre O' Neill conjuga-se a coordenação assindética com a sindética (vírgulas e conjunções coordenativas a separar as orações).


b) A nomeação do sujeito aparece em lugar diferente nos dois sonetos: no Auto-Retrato de Bocage aparece no último terceto, no Auto-Retrato de O' Neill aparece no 1.º verso.


c) No soneto de Bocage, utiliza-se a 3.ª pessoa (“se achou”) para referir o objecto de descrição e a 1.ª pessoa (“digo”) para designar o enunciador. Em contrapartida, O' Neill emprega igualmente a 3.ª pessoa para se referir quer ao objecto de enunciação, quer ao sujeito.



Coordenação assindética/sindética


As orações coordenadas podem ser:


- sindéticas: quando a conjunção coordenativa que as liga vem expressa;

- assindéticas: quando a conjugação coordenativa que as liga não vem expressa.


As conjunções coordenativas são conectores frásicos que ligam todos os tipos de categorias sintácticas (palavras, sintagmas, orações) desde que desempenhem idêntica função gramatical.

As conjunções coordenativas estabelecem relações de adição, alternância, oposição, conclusão, etc.



Conjunções coordenativas


Copulativas (indicam adição): e, nem, também, que

Disjuntivas (indicam alternativa): ou

Adversativas (indicam oposição): mas, porém, todavia, contudo, entretanto

Conclusivas (ligam duas orações, uma das quais exprime conclusão ou consequência da primeira): portanto, logo, pois

Explicativas (ligam duas orações, a segunda das quais justifica o conteúdo da primeira): pois, porquanto, porque




A Mena na Cozinha


Bacalhau com broa à minha maneira

4 postas de bacalhau do lombo demolhado

4 fatias de queijo

4 fatias de presunto

2 colheres de (sopa) de banha

1 colher de (sobremesa) de colorau

400 g de miolo de broa

2 dentes de alho picados

1 cebola picada

2 colheres de azeite

1 folha de louro

1 copo e meio de vinho branco


Coloque as postas de bacalhau demolhado num tabuleiro e regue com meio copo de vinho. Por cima de cada posta ponha uma fatia de presunto, outra de queijo e a folha de louro.

Leve ao forno quente a 170º.

Amasse o miolo de broa com o restante vinho, os alhos picados, a banha, a cebola picada, o restante azeite, e o colorau.


Tempere com pimenta e sal (caso seja necessário) e espalhe sobre o bacalhau, fazendo-o aderir com as costas de uma colher ou com as mãos.
Leve novamente ao forno até alourar bem a crosta.

Sirva quente, acompanhado com batatas salteadas ou fritas e salada.



Trabalhito:

Colar


Miminho


Este mimo florido foi-me oferecido pela Soninha. Obrigada, amiga!
Vai ficar aqui para quem o quiser levar! Basta deixarem uma palavrinha!


Dia do Professor: Para assinalar este dia deixo-vos um vídeo ternurento com uma música eterna e, infelizmente, "O homicídio da profissão de professor".


8 comentários:

artes_romao disse...

boa noite,td bem?
mas que belo bacalhau,aiiii....aiiii.
o colar está um mimo,parabéns.
levei o selinho comigo, bigado.
fica bem,jinhos***

Mona Lisa disse...

Olá Mena

Oportuno o vídeo da SIC de José Gil.

Adorei ouvir Louis Armstrong's enquanto saboreei o bacalhau.
Uma delícia!

Bjs.

artes_romao disse...

oi, de novo...
pois é...uma injustiça.
então tinhas esquecido do teu dia,lol...
jinhos***

Maria Cusca disse...

Olá amiga.
Obrigada pela visita, pelo apoio e pelo carinho.
Achei a comparação do auto-retrato, muito interessante.
O bacalhau tem um aspecto divinal.
E o trabalhinho está lindo.
Jinhos e uma óptima semana

Sonia Facion disse...

OI Mena!!!!

É uma grande perda, essa desvalorização do professor e essa falta de estímulo por parte dos nossos governantes.

Isso não ocorre só por aí, aqui tbm, imfelismente.

O vidio ternurento, valeu para amenizar, hehehe....

Uma linda semana prá ti amiga!!!

Sonia

~*Rebeca*~ disse...

Mena,

Aqui são 23:21hs e vou te contar:

Essa sua comida deu uma vontade de comer...affffffff, que maldade colocar foto assim...ahahaha

Beijo grande, menina linda

Rebeca

-

Edilene Pacheco disse...

Amigaaa,

Finalizei o PAP que fiz da flor especialmente para você. ebaaaa!!
Passe lá para pegar.Se você tiver dúvida me avise.Pois estou insegura quanto a clareza de informações.Mas fiz com todo carinho.

Bjsss

CAPELA disse...

Boa tarde Mema!
Devo de lhe agradecer, pois tive um trabalho de língua portuguesa para fazer e vim buscar informações sobre o auto-retrato aqui.
O resultado foi brilhante!
Agradeço mais uma vez! Continue com o magnifico trabalho!
P.S: Mas que bons cozinhados! 