Eça de Queirós
José Maria Eça de Queirós nasceu em 1845 na Póvoa de Varzim no seio de uma família culta. Entre 1861 e 1866, frequentou o curso de Direito na Universidade de Coimbra onde tomou contacto com as correntes ideológicas e literárias europeias da altura, nomeadamente, o positivismo, o socialismo e o realismo e o naturalismo. Aí conheceu Antero de Quental e Teófilo Braga, dois dos futuros representantes da Geração de 70.
Em 1867, integrou um grupo de amigos, chamado o Cenáculo, que promovia tertúlias literárias e ideológicas e do qual faziam parte Jaime Batalha Reis, Ramalho Ortigão, Oliveira Martins, Teófilo Braga, Antero de Quental, entre outros.
Em 1869 e 1870, Eça de Queirós viajou até ao Egipto para assistir à inauguração do Canal de Suez e esta viagem inspirou alguns dos seus trabalhos como, por exemplo, A Relíquia, apenas publicado em 1887.
Em 1871, participou nas chamadas Conferências do Casino Lisbonense, proferindo a quarta conferência intitulada “A Nova Literatura, o Realismo como Nova Expressão da Arte” que lançou os fundamentos da sua concepção do Realismo.
Em 1872, Eça iniciou a sua carreira diplomática como Cônsul de Portugal sucessivamente em Havana, Newcastle, Bristol e Paris.
Este afastamento do meio português e a experiência de vida no estrangeiro permitiram-lhe observar Portugal de forma mais objectiva. Aliás, foi em Inglaterra que Eça de Queirós escreveu a parte mais significativa da sua obra romanesca consagrada à crítica da vida social portuguesa.
A 16 de Agosto de 1900, Eça de Queirós, um dos maiores romancistas de toda a nossa literatura, morreu em Paris.
Conferências Democráticas do Casino Lisbonense
O grupo dos jovens intelectuais que se sublevaram contra Castilho na Questão Coimbrã juntou-se novamente após a conclusão dos seus cursos, desta vez em Lisboa, e acrescido de outras personalidades. Juntos formaram o Cenáculo, um grupo que promovia tertúlias literárias e ideológicas em nome da livre discussão de ideias e ideais, composto por Antero de Quental, Eça de Queirós, Teófilo Braga, Ramalho Ortigão, Jaime Batalha Reis, Salomão Saragga, Manuel Arriaga, Germano Meireles e Guerra Junqueiro.
Foi no Cenáculo que nasceu o projecto das Conferências Democráticas do Casino Lisbonense, uma consequência natural das discussões ideológicas travadas durante as reuniões de artistas e literatos. O programa das Conferências definia como seu principal objectivo reflectir acerca dos problemas responsáveis pelo estado de decadência do país e pelo seu afastamento em relação à Europa culta.
Com uma forte intenção democrática, as Conferências simbolizavam uma tentativa de colocar Portugal a par da actualidade europeia, ligando-o ao “movimento moderno”, agitando na opinião pública “as grandes questões da Filosofia e da Ciência Moderna" e estudando as “condições de transformação política, económica e religiosa da sociedade portuguesa”.
Assim, em 1871, numa altura em que no panorama internacional decorriam inúmeros acontecimentos, tais como a Comuna de Paris (principal insurreição operária e popular do século XIX), a unificação da Itália e as guerras na Polónia e na Irlanda, surgiram as Conferências Democráticas do Casino Lisbonense, que pretendiam abordar temas muito diversificados.
1ª Conferência: O Espírito das Conferências, de Antero de Quental.
A conferência inaugural afirmou a necessidade de regenerar Portugal "pela educação da inteligência e pelo fortalecimento da consciência dos indivíduos".
2ª Conferência: Causas da Decadência dos Povos Peninsulares, de Antero de Quental.
A segunda conferência apontou como principais causas de decadência do nosso povo o obscurantismo do catolicismo pós-tridentino, que tinha aniquilado as liberdades locais e individuais, e a política expansionista ultramarina, que havia impedido o desenvolvimento da pequena burguesia.
3ª Conferência: A Literatura Portuguesa, de Augusto Soromenho.
A terceira conferência denunciou a decadência da literatura portuguesa e defendeu a necessidade de "dar por base à educação a moral, o dever, do que aproveitará a literatura".
4ª Conferência: A Literatura Nova (O Realismo como Nova Expressão de Arte), de Eça de Queirós.
Na quarta conferência, Eça de Queirós lançou os fundamentos da sua concepção de Realismo, influenciada por Flaubert, Proudhon e Taine.
5ª Conferência: O Ensino, de Adolfo Coelho.
A quinta conferência coube a Adolfo Coelho, que, de uma forma revolucionária, propôs a reorganização do ensino em Portugal, designadamente a "separação completa do Estado e da Igreja".
As conferências foram interrompidas antes da sexta, por portaria ministerial do marquês de Ávila e Bolama, onde se alegava que estas se tinham sustentado em "doutrinas e proposições que atacavam a religião e as instituições políticas do Estado". Estavam ainda anunciadas as seguintes conferências, que espelhavam a pluralidade de temas que os seus mentores pretendiam abordar:
- Os Historiadores Críticos de Jesus, de Salomão Saragga;
- O Socialismo, de Batalha Reis;
- A República, de Antero de Quental;
- A Instrução Primária, de Adolfo Coelho;
- Dedução Positiva da Ideia Democrática, de Augusto Fuschini.
Os conferencistas reagiram contra a proibição com um protesto público, com o qual se solidarizaram vários intelectuais, como Alexandre Herculano, que acudiram em defesa da liberdade de expressão.
A Geração de 70
A Geração de 70, também conhecida como “Dissidência de Coimbra”, começou por ser constituída por um grupo de jovens intelectuais da última metade do século XIX, do qual fizeram parte alguns dos maiores vultos da literatura portuguesa, como Antero de Quental, Eça de Queirós, Ramalho Ortigão, Teófilo Braga e Guerra Junqueiro. Este grupo de jovens afirmou-se como elite intelectual entre 1865, data do polémico texto de Antero contra Castilho (“Bom senso e Bom gosto”), e 1871, data das Conferências do Casino.
Na década de 1870, Portugal vivia os efeitos dos movimentos do Fontismo e da Regeneração. A Geração de 70, claramente voltada para os valores da educação e da cultura, rebelou-se contra o progresso predominantemente material e mercantilista de Fontes Pereira de Melo. Manifestando um grande descontentamento face à situação política, cultural e social do país, os membros da Geração de 70 defendiam uma maior abertura e receptividade de Portugal à cultura europeia e a urgência de uma reforma cultural no país.
O cariz revolucionário desta elite intelectual era sustentado pela assimilação de ideias inovadoras da cultura europeia, nomeadamente através de leituras de autores franceses e alemães e do conhecimento de movimentos insurreccionais estrangeiros, como a Comuna de Paris1. Racionalistas, herdeiros do positivismo de Comte, do idealismo de Hegel e do socialismo utópico de Proudhon e Saint-Simon, os jovens da Geração de 70 protagonizaram uma autêntica revolução cultural no nosso país, nomeadamente através da Questão Coimbrã e das Conferências do Casino.
Quem foram os membros da Geração de 70?
Antero de Quental (1842-1890): é incontestavelmente o mestre da Geração de 70, assumindo um papel claramente interventivo nas Conferências do Casino. É também este grande poeta que protagoniza a Questão Coimbrã contra Feliciano de Castilho.
Eça de Queirós (1845-1900): conheceu Antero enquanto estudante em Coimbra e tornou-se um escritor emblemático do romance português e um paradigma do Realismo, que defendeu acerrimamente.
Ramalho Ortigão (1836-1915): apesar de inicialmente ser aliado de Castilho contra Antero, integrou a Geração e assumiu um papel preponderante na Questão Coimbrã. Escreveu As Farpas.
Teófilo Braga (1843-1924): deixou um espólio considerável nos estudos literários, na política, na investigação dos costumes portugueses e na tradição oral. Foi companheiro de Antero na Questão Coimbrã e, mais tarde, Presidente da República.
Guerra Junqueiro (1850-1923): escreveu poesia e fez parte do Cenáculo e dos “Vencidos da Vida”. Foi ministro após a implantação da República.
Oliveira Martins (1845-1894): foi deputado, ministro, jornalista, economista e investigador e um amigo próximo de Antero e Eça. Deixou importantes contributos nos estudos históricos, nomeadamente com História de Portugal ou Portugal Contemporâneo.
A Questão Coimbrã
A Questão Coimbrã, também conhecida como a “Questão do Bom Senso e Bom Gosto”, foi a primeira e uma das mais importantes manifestações do grupo que viria a ser apelidado de Geração de 70. Na linha da frente estiveram sempre Antero de Quental, o “Príncipe da Mocidade”, e Teófilo Braga, já conhecidos no mundo das letras.
O motivo que desencadeou a revolta coimbrã, ou, como lhe chamou Antero de Quental, a famosa “Questão Literária ou a Questão de Coimbra”, foi aparentemente trivial. Em 1865, Pinheiro Chagas publicou o Poema da Mocidade, uma biografia lírica típica do saudosismo ultra-romântico. Na carta-posfácio redigida por António Feliciano de Castilho, este aludiu à moderna escola de Coimbra e à sua poesia ininteligível, referências claramente adversas a Antero e a Teófilo.
Este ataque directo, aliado ao desejo de polémica dos académicos coimbrões, levou Antero a lançar um opúsculo, intitulado Bom Senso e Bom Gosto, as duas virtudes que Castilho lhes negava. Antero contestava o exagero cansativo do gosto ultra-romântico personificado em Castilho e na sua escola, que apelidou de "Escola do Elogio Mútuo", uma vez que os seus membros mais não faziam do que elogiarem-se constantemente. Num tom, de certo modo, panfletário, Antero delineou um conceito novo da missão do escritor, reivindicando a liberdade e a independência de espírito, contra as teocracias literárias. Este protesto, que se investiu de um carácter essencialmente moral, afirmou a insubmissão iconoclasta dos jovens de Coimbra à escola de Castilho.
Quando os intelectuais conservadores acorreram em defesa de Castilho, instaurou--se a batalha. Os artigos, folhetins e opúsculos em apoio de uma e de outra parte multiplicaram-se. Do lado da nova geração, aberta às recentes correntes europeias, seguiu-se o opúsculo de Antero, A Dignidade das Letras e as Literaturas Oficiais, e o panfleto de Teófilo, Teocracias Literárias. Do lado do patriarca literário, surgiu Literatura de Hoje, do ilustre Ramalho Ortigão, que viria a integrar mais tarde a Geração de 70. A batalha entre o Romantismo agonizante e o novo Realismo fervilhante prolongou-se pelo ano de 1866. A partir de Março desse ano, a polémica começou a declinar em quantidade e qualidade.
Com a Questão Coimbrã entraram em conflito o velho sentimentalismo do Ultra-romantismo vernáculo e o novo espírito científico europeu. Apareceu um novo lirismo social, humanitário e crítico que se insurgiu contra a tirania do gosto literário protagonizada por Castilho. No entanto, a questão não foi só literária, mas denunciou incompatibilidades mais profundas, espelhando um movimento político, histórico e filosófico de grande amplitude. Sacudiu, também, o marasmo da vida cultural do país, e, se não contribuiu, desde logo, para a introdução do Realismo em Portugal, veio demarcar as fronteiras entre os autênticos românticos e o Ultra-romantismo obsoleto e convencional.
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