segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Poema aos homens constipados


Pachos na testa, terço na mão,
Uma botija, chá de limão,
Zaragatoas, vinho com mel,
Três aspirinas, creme na pele
Grito de medo, chamo a mulher.
Ai Lurdes que vou morrer.
Mede-me a febre, olha-me a goela,
Cala os miúdos, fecha a janela,
Não quero canja, nem a salada,
Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada.
Se tu sonhasses como me sinto,
Já vejo a morte nunca te minto,
Já vejo o inferno, chamas, diabos,
Anjos estranhos, cornos e rabos,
Vejo demónios nas suas danças
Tigres sem listras, bodes sem tranças
Choros de coruja, risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes fica comigo
Não é o pingo de uma torneira,
Põe-me a Santinha à cabeceira,
Compõe-me a colcha,
Fala ao prior,
Pousa o Jesus no cobertor.
Chama o Doutor, passa a chamada,
Ai Lurdes, Lurdes nem dás por nada.
Faz-me tisana e pão de ló,
Não te levantes que fico só,
Aqui sozinho a apodrecer,
Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer.



António Lobo Antunes - (Sátira aos HOMENS quando estão com gripe)

4 comentários:

Mona Lisa disse...

Olá Mena

Já conhecia. Há muito, tb o publiquei.

Está fabuloso.O retrato fiel do homem "doentinho"...

Bjs.

mfc disse...

E é mesmo assim!

gatinhafofa disse...

ena ena que autentico sentido de humor nesse poema nostalgico,fez-me rir imenso. mil beijinhos!!

Nicas disse...

Boa tarde,
Antes de mais parabéns pelo blog.
Eu gostaria de apresentar este poema na minha aula de português mas, tenho de fazer a análise do poema, tem alguma sugestão?

Obrigada