O orçamento de Estado para
2013 quer tapar à bruta três enormes buracos: um enorme buraco resultante de
uma enorme derrapagem do orçamento de 2012; um enorme buraco orçamental
previsto para 2013; e um enorme buraco que resultará de uma enorme derrapagem
na execução de 2013, prevista por antecipação, passe a redundância, no próprio
orçamento de 2013. Com efeito, lá estão alguns milhares de milhões de
“almofada”: para uma receita que, embora orçamentada, não será cobrada; para
responder ao desemprego que esconde; e para suprir um corte na despesa que,
embora orçamentado, acabará por não ser feito. Com 3 milhões de pobres e os
restantes exaustos pelo confisco fiscal, com o PIB a cair entre 2,8 e 5,3 por
cento (FMI dixit), só fanáticos suicidas orçamentam assim. É preciso
pará-los.
A credibilidade técnica de
Vítor Gaspar foi um mito com pés de barro. Estimou que as receitas do IVA
subiriam 11,6 por cento e acabaram caindo 2,2. Previu, em Março passado, que o
encargo do Estado com o desemprego cresceria 3,8 por cento e, em Agosto, já ia
em 23. O consumo público contraiu 3,2 por cento em 2011 e a Comissão Europeia
estima que contraia 6,2 este ano. O consumo privado caiu 4,2 por cento em 2011
e a CE prevê que caia 5,9 este ano. E Gaspar ignora, quando orçamenta e
taxa. E ignora o Tribunal Constitucional. E volta a ignorar, com arrogância e
desprezo, o presidente da República e o próprio FMI. Ignora tudo e todos. E
ignora o “melhor povo do mundo”, que esmaga com impostos em 2013.
Mas a credibilidade política
de Passos Coelho não vai melhor. Em Novembro de 2010, Passos Coelho clamou para
o país uma “nova cultura de responsabilidade”, num jantar partidário em Viana
do Castelo, promovido pelo PSD de Barcelos. Da sua intervenção saltou para o
debate público, via Lusa, a defesa que fez da necessidade de responsabilizar os
políticos, civil e criminalmente, por aquilo que fazem. “Quem impõe tantos
sacrifícios às pessoas e não cumpre, merece ou não merece ser responsabilizado
civil e criminalmente pelos seus actos?”, perguntou então Passos Coelho. E,
na mesma altura, afirmou: “Se nós temos um Orçamento e não o cumprimos, se
dissemos que a despesa devia ser de 100 e ela foi de 300, aqueles que são
responsáveis pelo resvalar da despesa também têm de ser civil e criminalmente
responsáveis pelos seus actos e pelas suas acções. … Não podemos permitir
que todos aqueles que estão nas empresas privadas ou que estão no Estado fixem
objectivos e não os cumpram. Sempre que se falham os objectivos, sempre que a
execução do orçamento derrapa, sempre que arranjamos buracos financeiros onde
devíamos estar a criar excedentes de poupança, aquilo que se passa é que há
mais pessoas que vão para o desemprego e a economia afunda-se…”.
Quando assim falou, Passos
Coelho pensava na Lei 34/87 (crimes de responsabilidade dos titulares de cargos
políticos), sucessivamente alterada em 2001, 2008 e 2010 (leis 108, 30 e 41,
respectivamente). O que Passos disse de outros caiu-lhe agora em cima.
Porque não cumpriu nada do que prometeu e porque falhou grosseiramente os
objectivos orçamentais, Passos disse que Passos deve ser responsabilizado civil
e criminalmente. Passos morreu pela boca de Passos.
A obsessão de Gaspar e Passos
para iludirem o óbvio, substituindo a racionalidade básica pela fé dos
alienados, matou-os. O velório virá logo que Portas acabe de tirar as
fotocópias.
É óbvio que o problema de
Portugal, sendo a dívida grande, não é a dívida. É a ameaça de não a poder
pagar, com uma economia que não cresce e um desemprego imparável.
É óbvio que chegámos aqui
empurrados por gente trapaceira, protegida por uma justiça injusta.
É óbvio que só a promoção do
investimento produtivo, o aumento do que vendemos lá fora, a diminuição do que
compramos cá dentro e a recondução do Estado ao seu papel de árbitro justo de
interesses opostos nos poderá arrancar às garras de uma máfia de especuladores
e agiotas, a que alguns chamam mercado.
É óbvio que esta austeridade
não muda o futuro.
A nossa democracia (e a
democracia da Europa, importa sublinhá-lo) resume-se a rituais eleitorais, cada
vez menos concorridos, que sujeitam a vida pública a modernas formas de
ditadura. Guardadas as urnas, os pilares da democracia (a informação e a
participação) são amordaçados e domados pelos vencedores, que passam o ciclo a
bramir a legitimidade que o voto lhes conferiu. Mesmo que a tenham perdido
grosseiramente, por fazerem o contrário daquilo que prometeram quando o
disputaram. Mesmo que a mentira sem pudor se lhes cole à cara sem vergonha.
Passos Coelho é um belo exemplo do que afirmo. Dificilmente encontramos quem
mais gravemente tenha ferido a confiança dos que acreditaram nele.
Santana Castilho
1 comentário:
Já deviam estar presos.
E ainda vão dizer que a culpa é do povo que não os percebeu...
Beijo.
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