sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Outras formas de se despirem




Estava no cabeleireiro e a funcionária que me atendia, estendeu-me uma revista, é para passar o tempo, disse. A revista tinha na capa uma actriz que conheci numa apresentação da Samsung Portugal e que para meu espanto não é nada como a vemos nas revistas nem na televisão... É baixinha e não é nada bonita, comparada com muitas das comuns mortais que existem por aí. Comentei o facto com a cabeleireira que anuiu:
- Quando trabalhava em Lisboa, fartei-me de cortar cabelos a actrizes, modelos, cantoras, apresentadoras de televisão... Tinha até uma bela colecção de pessoas do mundo do espectáculo que penteava e até lhe posso dizer que algumas tiveram de me dizer quem eram, pois eu não as reconheci... E em certos casos, até duvidei que estivessem a dizer a verdade.
Folheei a revista e nas páginas centrais, aparecia uma actriz praticamente nua em várias poses, mais ou menos, ousadas...
A cabeleireira olhou e disse:
- Hoje, todas se despem e até as menos bonitas, ficam belíssimas.
- É o poder do Photoshop, estica daqui, encolhe dali, alisa, encobre... e fica tudo perfeitinho! – disse-lhe rindo e acrescentei – Mas, a beleza é efémera, há que ter algo mais do que um rosto e corpo bonitos...
De repente, lembrei-me de um texto que tinha visto na Net, de uma jornalista brasileira, peguei no ipad, procurei e mostrei-o à cabeleireira:

Depois da invenção do photoshop, até a mais insignificante das criaturas vira uma deusa, basta uns retoquezinhos, aqui e ali. Nunca vi tanta mulher nua.
Os sites da internet renovam semanalmente seu estoque de gatas vertiginosas.
O que não falta é candidata para tirar a roupa. Dá uma grana boa.
E o namorado apoia, o pai fica orgulhoso, a mãe acha um acontecimento, as amigas invejam, então pudor para quê?
Não sei se os homens estão radiantes com esta multiplicação de peitos e bundas. Infelizes não devem estar, mas duvido que algo que se tornou tão banal ainda enfeitice os que têm mais de 14 anos.
Talvez a verdadeira excitação esteja, hoje, em ver uma mulher se despir de verdade... Emocionalmente.
Nudez pode ter um significado diferente e muito mais intenso.
É assistir a uma mulher desabotoar suas fantasias, suas dores, sua história.
É erótico uma mulher que sorri, que chora, que vacila, que fica linda sendo sincera, que fica uma delícia sendo divertida, que deixa qualquer um maluco sendo inteligente.
Uma mulher que diz o que pensa, o que sente e o que pretende, sem meias-verdades, sem esconder seus pequenos defeitos.
Aliás, deveríamos nos orgulhar de nossas falhas, é o que nos torna humanas, e não bonecas de porcelana.
Arrebatador é assistir ao desnudamento de uma mulher em que sempre se poderá confiar, mesmo que vire ex, mesmo que saiba demais.
Pouco tempo atrás, posar nua ainda era uma excentricidade das artistas, lembro que se esperava com ansiedade a revista que traria um ensaio de Dina Sfat, por exemplo.
- para citar uma mulher que sempre teve mais o que mostrar além do próprio corpo.
Mas agora não há mais charme nem suspense, estamos na era das mulheres coisificadas, que posam nuas porque consideram um degrau na carreira. Até é. Na maioria das vezes, rumo à decadência. Escadas servem para descer também.
Não é fácil tirar a roupa e ficar pendurada numa banca de jornal, mas, difícil por difícil, também é complicado abrir mão de pudores verbais, expor nossos segredos e insanidades, revelar nosso interior.
Mas é o que devemos continuar fazendo.
Despir nossa alma e mostrar para valer quem somos, o que trazemos por dentro. Não conheço strip-tease mais sedutor.



- Gostei do texto, e é como disse, hoje, é preciso ter-se realmente mais do que um rosto e um corpo bonitos… - concordou a cabeleireira, enquanto eu pagava e me despedia.

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