Portugal fica mortalmente ferido, vergonhosamente espoliado e cruelmente amesquinhado e ridicularizado pelo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 (AOLP). Ferido na sua língua, seu património maior, espoliado do seu direito a ela, amesquinhado e ridicularizado na sua dignidade de antiga nação europeia, pelo próprio processo e pelos termos desse documento.
Porque as palavras voam, os escritos permanecem, proponho-me passar em revista, por ordem cronológica, aspectos significativos do que tem ficado escrito de todo este processo, para ilustração dos contemporâneos e memória dos vindouros. Antes, porém, gostaria de salientar duas ou três coisas, para que melhor se possa compreender a dimensão do que está em causa.
Primeiro – a reforma ortográfica de uma língua é em geral um processo interno, mais ou menos profundo, levado a cabo por especialistas, com amplo debate público, tendo em conta a evolução, a história e as especificidades dessa mesma língua. Outra coisa, bem diferente, no âmbito, forçosamente muito restrito, e nos objectivos, é um acordo ortográfico internacional. Em qualquer dos casos, a informação e o debate públicos são imprescindíveis.
Segundo – a Academia Brasileira de Letras fez, em 1907, unilateralmente, uma reforma da ortografia brasileira, afastando-a da portuguesa, com o intuito de a simplificar, e de a aproximar da fonética; por sua vez, em 1911, o Governo português nomeou uma comissão de filólogos para que estabelecesse as bases duma reforma da ortografia portuguesa.
Terceiro – a preocupação com a ortografia do Português, que atravessou todo o século XX e continua até hoje, concerne essencialmente as duas normas da língua, a brasileira e a portuguesa, já que esta última é também a que vigora nos outros países de língua portuguesa.
Quarto – em consequência do que foi referido no segundo ponto, a questão ortográfica levou a sucessivas tentativas de reaproximação da ortografia portuguesa e brasileira, sob a forma de Acordos, sistematicamente desrespeitados pelo Brasil, designadamente o de 1931 e o de 1945, sendo este último, no essencial, o que tem estado em vigor em Portugal e restantes países de língua portuguesa.
Quinto – O já referido Acordo de 1945 foi também inicialmente adoptado no Brasil (Dec.-lei 8.286, de 05.12.1945), tendo sido aí rejeitado, dez anos mais tarde, pelo Dec.-lei 2.623, de 21.10.1955. Aliás, a própria Constituição brasileira de 1946 foi redigida segundo as normas anteriormente estipuladas pelo Formulário Ortográfico de 1943.
Sexto – Estas questões poderiam ter ficado tranquilamente por aqui, Portugal e Brasil usufruindo de total soberania, também no que toca à sua própria norma do Português . Mas elas reacenderam-se, nomeadamente em 1975 e em 1986 e, de novo, em 1990, com este AOLP. A propósito, convoco agora o testemunho insuspeito do Prof. Maurício Silva, brasileiro, da Universidade de São Paulo: «Assim, pode-se dizer que grande parte da discussão em torno da ortografia da língua portuguesa – como , de resto, em torno da própria língua – redunda na tentativa de afirmação nacionalista de uma vertente brasileira do idioma, em franca oposição à vertente lusitana.» (in Reforma Ortográfica e Nacionalismo Lingüístico no Brasil)
Posto isto, como é possível que este falso “Acordo” de 1990 – porque se trata de facto, pela sua dimensão e implicações, da imposição de uma verdadeira reforma ortográfica da nossa língua materna, o Português europeu – constitua a base de um tratado internacional, assinado por Portugal, apesar de amplamente condenado do ponto de vista linguístico pelos nossos especialistas?
Todos os aspectos nefastos, propriamente científicos e culturais, deste AOLP foram já abundante e rigorosamente tratados por quem de direito. Parece, contudo, que os decisores políticos, por qualquer razão obscura, se mantêm imunes a todos esses argumentos, a pretexto de não poderem ter “opinião”… Revelam assim uma tremenda insensibilidade face ao valor patrimonial e identitário da nossa língua nacional, que é também, convém lembrar, património europeu, ao mesmo título que qualquer uma das outras 22 línguas nacionais da União Europeia.
Também as incongruências de carácter jurídico, que caracterizam todo este processo, têm sido repetidamente objecto de denúncias provenientes de personalidades da área do direito, aparentemente acolhidas com a mesma indiferença e alheamento. Aproveito para recordar alguns desses atropelos, absolutamente gritantes, para qualquer cidadão medianamente instruído:
1.- O Artigo 2º do AOLP estipula a obrigação para os “Estados signatários” de, antes da entrada em vigor deste Acordo, e “através das instituições e órgãos competentes” promoverem a elaboração “de um vocabulário ortográfico comum da língua portuguesa, tão completo quanto desejável e tão normalizador quanto possível, no que se refere às terminologias científicas e técnicas.”
Observação: sem que esse “vocabulário” tenha sido elaborado, nas condições aí impostas, em Portugal (e só falo do meu país), o AOLP está já a ser aplicado, no Ensino e na Administração sob tutela do Governo, assim como no Diário da República, e também, por uma questão de seguidismo e de prepotência, sobretudo por alguns media, designadamente a RTP.
2. – O Artigo 3.º do AOLP diz: “O AOLP entrará em vigor em 1 de Janeiro de 1994, após depositados os instrumentos de ratificação de todos os Estados junto do Governo da República Portuguesa” (o sublinhado é meu).
Observação: O tempo passou e essa data foi removida pelo Primeiro Protocolo Modificativo, em Julho de 1998.
3. – O Acordo do Segundo Protocolo Modificativo ao AOLP, assinado na cimeira da CPLP, em São Tomé, a 25 de Julho de 2004, deu nova redacção ao Artigo 3.º atrás referido:
“O AOLP entrará em vigor com o terceiro depósito de instrumento de ratificação junto da República Portuguesa” (o sublinhado é meu).
Observação:
Assim, três países em oito podem decidir da língua que lhes é comum! E pelo que a Portugal diz respeito, é a nossa língua nacional que fica deste modo à mercê das decisões alheias. Vejamos agora como é justificada esta decisão: porque o Acordo “ainda não pôde entrar em vigor por não ter sido ratificado por todas as partes contratantes”; porque “se adoptou a prática, nos Acordos da CPLP, de estipular a entrada em vigor com o depósito do terceiro instrumento de ratificação”; porque os “Ministros da Educação da CPLP” “reiteraram ser o Acordo Ortográfico um dos fundamentos da Comunidade” (note-se: é o AO e não a própria língua; o sublinhado é meu)!
Pergunto: – é por esta concepção da democracia e da Língua Portuguesa que se regem os estatutos da CPLP?
4. – A Resolução da Assembleia da República n.º 35/2008, de 16 de Maio de 2008, aprova o Acordo do Segundo Protocolo Modificativo acima referido e, no Artigo 2.º, ponto 2., estabelece: “No prazo limite de seis anos após o depósito do instrumento de ratificação do Acordo do Segundo Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, a ortografia constante de novos actos, (…), deve conformar-se às disposições do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.”
Observação:
Permito-me perguntar se aqueles deputados, eleitos por nós, leram e entenderam as implicações desse Protocolo: se não leram, é muito grave; e se leram, visivelmente não entenderam que o nosso voto e a nossa Constituição não lhes davam o direito de abdicar da nossa soberania, relativamente à nossa língua nacional e ao modo como devemos escrevê-la!
5.- O Acordo do Segundo Protocolo Modificativo é ratificado, em 21 de Julho de 2008, pelo Decreto do Presidente da República n.º 52/2008, de 29 de Julho.
Observação: Porque é que, neste caso, vital para a nossa soberania, não foi usado o direito de veto do Presidente de Portugal?
6. – O DR, 1.ª série – N.º182 -17 de Setembro de 2010, publica o Aviso n.º 255/2010, do Ministério dos Negócios Estrangeiros, com data de 13 de Setembro de 2010, comunicando que, “tendo” o Brasil e Cabo Verde depositado os instrumentos de ratificação do Acordo do Segundo Protocolo Modificativo, “em 12 de Junho de 2006”, e “tendo” “São Tomé e Príncipe efectuado o respectivo depósito em 6 de Dezembro de 2006, o referido Acordo do Segundo Protocolo Modificativo entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2007”.
Quanto a Portugal: “O depósito do respectivo instrumento de ratificação foi efectuado em 13 de Maio 2009, tendo o referido Acordo entrado em vigor para Portugal nessa data.”
Observação: As datas por mim sublinhadas deveriam, só por si, “gritar” que “há qualquer coisa de podre em todo este processo e, portanto, neste nosso país”!
7.- A Resolução do Conselho de Ministros n.º8/2011, de 9 de Dezembro de 2010, determinou a aplicação do AOLP pelo “Governo e todos os serviços (…) sujeitos aos poderes de direcção, superintendência e tutela do Governo”, assim como pelo D.R., a partir de 1 de Janeiro de 2012, e ainda determinou que ele seria “aplicável ao sistema educativo no ano lectivo 2011-2012, bem como aos respectivos manuais escolares (…) cabendo ao membro do Governo responsável pela área da educação definir um calendário (…) de implementação (…).”
Recorde-se que esta mesma Resolução, do Governo anterior, “adopta, ainda, o Vocabulário Ortográfico do Português, (…) e o conversor Lince (…) ambos desenvolvidos pelo Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC) com financiamento público do Fundo da Língua Portuguesa.“
Não resisto a completar com esta outra passagem: “Deve referir-se que a cooperação no seio dos países de língua portuguesa tem assumido uma importância crescente, o que levou à criação, pelo Governo, do Fundo da Língua Portuguesa, destinado a promover a língua como factor de desenvolvimento e de combate à pobreza.”
Observação: Também a data desta Resolução, a relacionar com as do Aviso n.º255/2010, assim como as citações aqui sublinhadas me parecem pôr em causa a salubridade deste “acelerado” processo e do nosso país! Mas o Governo actual, que veio para corrigir os “desmandos” do Governo anterior, e que tinha todos os pretextos para suspender esta Resolução, inexplicavelmente manteve-a e apressou-se a concretizá-la!
Deixando de lado estas questões, proponho-me agora seleccionar algumas passagens do próprio texto do AOLP de duvidosa veracidade ou que nos ridicularizam, para que se saiba que, por qualquer motivo, a nação portuguesa, que levou a sua língua a tão longínquas zonas do planeta, se viu obrigada a penitenciar-se por ter “ousado” dispor dessa mesma língua!
Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (notar as passagens que destaco)
(Assinado em Lisboa, a 16 de Dezembro de 1990, pelos então sete países de língua portuguesa. Por Portugal, Pedro Miguel Santana Lopes, Secretário de Estado da Cultura):
Considerando que o projecto de texto de ortografia unificada de língua portuguesa aprovado em Lisboa, em 12 de Outubro de 1990 (…) constitui um passo importante para a defesa da unidadeessencial da língua portuguesa e para o seu prestígio internacional;
Considerando que o texto do Acordo que ora se aprova resulta de um aprofundado debate nos países signatários: (…)
Em fé do que os abaixo assinados, devidamente credenciados para o efeito, aprovam o presente Acordo, redigido em língua portuguesa, (…)”
Observações:
1.- Como com o tempo se vem amplamente confirmando, essa “ortografia unificada” é uma imensa falácia (o que era igual fica diferente, proliferam as múltiplas grafias, etc.).
2.- Nem é já possível a “unidade” da língua portuguesa, nem o seu “prestígio internacional” (da norma portuguesa ou brasileira?) depende de um qualquer acordo ortográfico e ainda menos do caos ortográfico agora aqui instalado e da “desalfabetização” em curso no nosso país.
3. – O ”aprofundado debate” em Portugal não existiu e é de calcular que nos outros países tenha sucedido o mesmo.
4. – O texto do Acordo (Anexo I) está redigido em conformidade com a nova ortografia, que então, obviamente, ainda não existia (e os signatários não se aperceberam disso!…).
N. B.: Esta incongruência será aliás detectada mais tarde e corrigida pela Rectificação n.º 19 / 91 da Assembleia da República, de 15 de Outubro de 1991:
(…) na p. 4388, no ponto 8 (anexo II), onde se lê «Estrutura do novo texto» deve ler-se «Estrutura e ortografia do novo texto», e no texto do mesmo ponto 8 falta um terceiro parágrafo, com a seguinte redacção:
«Por último, dado que melhor se pode compreender e aprender um extenso Acordo como o presente através de um texto integral na nova ortografia, optou-se por que o texto do próprio Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990) desde já a utilizasse.»
1 – Memória breve dos acordos ortográficos
1.º – A existência de duas ortografias oficiais da língua portuguesa, a lusitana e a brasileira tem sido considerada como largamente prejudicial para a unidade intercontinental do português e para o seu prestígio no Mundo.
2.º – Tal situação remonta, como é sabido, a 1911, ano em que foi adoptada em Portugal a primeira grande reforma ortográfica, mas que não foi extensiva ao Brasil.
3.º – Por iniciativa da Academia Brasileira de Letras, em consonância com a Academia da Ciências de Lisboa, com o objectivo de se minimizarem os inconvenientes desta situação, foi aprovado em1931 o primeiro acordo ortográfico entre Portugal e o Brasil. Todavia, por razões que não importa agora mencionar, este acordo não produziu, afinal, a tão desejada unificação (…) “novo encontro entre representantes daquelas duas agremiações, o qual conduziu à chamada Convenção Ortográfica Luso-Brasileira de 1945. Mais uma vez, porém, este Acordo não produziu os almejados efeitos, já que ele foi adoptado em Portugal, mas não no Brasil.
7.º – O Acordo Ortográfico de 1986, conseguido na reunião do Rio de Janeiro, ficou, porém, inviabilizado pela reacção polémica contra ele movida sobretudo em Portugal.
Observações:
Tendo em conta os factos já referidos no início deste texto, as passagens sublinhadas falam por si, prescindindo de comentários: os autores deste Acordo mentiram em toda a linha, pois entenderam ser necessário “acusar” Portugal pela existência de duas ortografias, a portuguesa e a brasileira, o que em sua opinião “tem sido considerado” (por quem?) altamente nocivo para o prestígio do Português no Mundo! Esse Mundo que conhece a nossa língua há séculos, porque os portugueses a lá levaram! O tom condenatório adoptado para rebaixar Portugal aí fica, escrito para a eternidade!
2 – Razões do fracasso dos acordos ortográficos
4.º Também o Acordo de 1945 propunha uma unificação ortográfica absoluta (…). Mas tal unificação assentava em dois princípios que se revelaram inaceitáveis para os brasileiros:
a) Conservação das chamadas consoantes mudas ou não articuladas, o que correspondia a umaverdadeira restauração destas consoantes no Brasil, uma vez que elas tinham há muito sido abolidas;b) Resolução das divergências de acentuação das vogais tónicas e e o seguidas das consoantes nasais m e n, das palavras proparoxítonas (ou esdrúxulas) no sentido da prática portuguesa, que consistia em as grafar com acento agudo e não circunflexo, conforme a prática brasileira.” (vd. António / Antônio; género / gênero, etc.)
6.º (…) não é possível unificar por via administrativa divergências que assentam em claras diferenças de pronúncia, um dos critérios, aliás, em que se baseia o sistema ortográfico da língua portuguesa.
Observações:
1.- Convém ver bem quais os “dois princípios (…) inaceitáveis para os brasileiros”.
2.- Interessante ainda notar esse 6.º ponto acima destacado: as contradições não atrapalham os autores deste Acordo que, justamente mais não faz do que aplicar à nossa ortografia aquilo que se lhes afigura inaceitável do ponto de vista brasileiro.
3 – Forma e substância do novo texto
2.º – “Em relação às alterações de conteúdo, elas afectam sobretudo o caso das consoantes mudas ou não articuladas, o sistema de acentuação gráfica, especialmente das esdrúxulas, e a hifenação.”
Observação:
Em síntese eis claramente indicado o objectivo essencial deste Acordo. Note-se que os dois primeiros pontos regressam, contrariando-os, aos “princípios” que os brasileiros consideraram como “inaceitáveis” no Acordo de 1945. É o caso de se dizer: “a vingança serve-se fria”!
4.2. – Justificação da supressão de consoantes não articuladas [base IV, 1.º, b ]
d) “A divergência de grafias existente neste domínio entre a norma lusitana, que teimosamenteconserva consoantes que não se articulam em todo o domínio geográfico da língua portuguesa, e anorma brasileira, que há muito suprimiu tais consoantes, é incompreensível para os lusitanistas estrangeiros, nomeadamente para professores e estudantes de português, já que lhes cria dificuldades suplementares, nomeadamente na consulta dos dicionários, uma vez que as palavras em causa vêm em lugares diferentes da ordem alfabética, conforme apresentam ou não a consoante muda;”
e) “Uma outra razão, esta de natureza psicológica, embora nem por isso menos importante, consiste na convicção de que não haverá unificação ortográfica da língua portuguesa se tal disparidade não for resolvida;
f) “Tal disparidade ortográfica só se pode resolver suprimindo da escrita as consoantes não articuladas, por uma questão de coerência, já que a pronúncia as ignora, e não tentando impor a sua grafia àqueles que há muito as não escrevem, justamente por elas não se pronunciarem.”
Observações:
1.- Mais uma vez, aí está o tom vexatório adoptado para referir tudo o que concerne a norma portuguesa, como se apenas lhe restasse a obrigação de acatar as opções “há muito” feitas no Brasil.
2.- Quanto aos “lusitanistas estrangeiros”, duvido que pudessem apreciar o retrato inteligente que deles aqui é feito, estando certamente habituados às grandes línguas europeias, que não precisaram de apagar as suas marcas etimológicas!
3.- Repare-se ainda no tom ameaçador das alíneas e) e f), que se pode facilmente traduzir: ou deixam cair essas consoantes ou não haverá “unificação ortográfica”! E quem disse a estes senhores que nós, portugueses, queríamos a unificação ortográfica? Alguém nos perguntou se estávamos interessados? Não! Foi tal o receio que tiveram da nossa recusa que a solução encontrada foi a imposição pura e dura do AOLP!
4.- Quanto ao rigor científico de toda essa “justificação”: palavras para quê?!
Este AOLP foi objecto de inúmeros pareceres de especialistas e de instituições, todos eles muito críticos. A favor, um apenas, do próprio autor do Acordo! Limitei-me a chamar a atenção dos meus concidadãos para alguns aspectos significativos e paradigmáticos da qualidade deste instrumento que o poder político nos está a impor.
Conclusão: Esta ilusória “unificação” ortográfica é uma mistificação, em nome da qual se está a procurar destruir a estabilidade e a solidez da ortografia do português europeu, para promover anorma brasileira. E digo “europeu”, por oposição a brasileiro, pois é desta dualidade do português que se trata. E é entre Portugal e Brasil que, há mais de um século, esta “guerra” periodicamente se reacende.
Foi aqui, neste espaço geográfico, que a língua portuguesa surgiu, confundindo-se a sua origem com os primeiros passos do que viria a ser Portugal. Aqui cresceu, se consolidou e afirmou e daqui, já amplamente configurada, a levámos para o vasto mundo. Hoje ela é também pertença de outros povos e comunidades que, connosco, têm todo o interesse em que conserve a sua integridade, no respeito pelas variáveis que cada um lhe possa trazer. Mas essa integridade na diversidade está agora em risco, em consequência das novas alterações ortográficas, impostas por decisão política, que a desfiguram e corrompem gravemente.
A língua portuguesa, tal como se fala e escreve em Portugal, não é propriedade privada de cada um de nós, ao nosso dispor para com ela servirmos eventuais interesses políticos, económicos ou outros: trata-se de um património colectivo, constitutivo da nossa identidade de portugueses e europeus, que recebemos em toda a sua pujança e dignidade e de que somos responsáveis perante as gerações futuras. A sua defesa, contra este AOLP é, pois, uma questão nacional, que nos convoca a todos, individual e colectivamente, independentemente das nossas pertenças ou afinidades ideológicas, partidárias ou outras! Por isso é também transversal a toda a sociedade portuguesa a Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico(http://ilcao.cedilha.net/), que propõe um Projecto de Lei de Revogação da Resolução da Assembleia da República n.º35/2008, e que continua a recolher assinaturas (em papel) de cidadãos eleitores decididos a salvar o português europeu!
Termino repetindo a todos os cidadãos portugueses o apelo, que é também um desafio, que lancei em carta ao Governo, a 27 de Junho de 2011: «os compromissos desonrosos, é uma honra e um dever não os respeitar. A nossa língua merece e agradece!»
Maria José Abranches Gonçalves dos Santos
1 comentário:
Este desacordo é um descalabro. E ninguém faz nada... o poder político apenas se preocupa com o défice, que nem consegue controlar...
Mena, querida amiga, tem um bom fim de semana.
Beijo.
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