43.
7. Modos de expressão literária
A descrição quase se equipara em importância, n' Os Maias, à narração. Ela corresponde ao desenvolvimento de subtítulo do romance "Cenas da Vida Romântica". Os episódios de crítica social são quadros descritivos em que as personagens aparecem irmanadas com os lugares. o impressionismo destas descrições provém da animização da natureza e das coisas, como prolongamento do interior das personagens. A descrição de interiores, mais frequente do que a de exteriores, reflecte a solidariedade personagem/habitação. A mudança de habitação surge sempre relacionada com novas etapas e vivências psicológicas das personagens.
A descrição de espaços, quer interiores, quer exteriores, é-nos quase sempre dada sob focalização interna de personagens. Veja-se, por exemplo, a descrição enquadrada no passeio de Carlos e Cruges a Seteais (pág. 233): "Cruges agora admirava o jardim..." Esta bela e impressionista descrição do jardim de Seteais é claramente perspectivada sob o olhar de artista de Cruges. Da mesma forma, a última descrição do Ramalhete e do seu espaço circundante (da pág. 707 a 710) é perspectivada por Carlos e Ega e reflecte bem o seu estado de espírito de desalento e profundo pessimismo. A descrição processa-se quase sempre numa dinâmica de fluir cinematográfico, dada sobretudo pelo uso do imperfeito verbal e do gerúndio, o que torna a linguagem mais visualista.
Os quadros descritivos partem sempre da realidade observada (ao contrário do que sucede no Romantismo), embora a imaginação do autor tudo eleve ao domínio do sonho, mediante expedientes estilísticos próprios de um realismo impressionista.
A narração processa-se quase sempre mediante o uso do perfeito verbal narrativo, ou do mais-que-perfeito. Nos episódios descritivos/narrativos surge mais vezes o imperfeito e o gerúndio. A narração torna-se mais sóbria na intriga trágica, apresentando-se com notável economia de palavras os acontecimentos numa sucessão apropriada à criação de suspense.
O diálogo tem uma importância muito grande. Este contribui para o ritmo lento que se verifica na narrativa central. O diálogo é emotivo, sério e elegante na intriga trágica (ver nas páginas 644 e seguintes, o diálogo em que Carlos comunica ao avô que Maria Eduarda é sua irmã); e, pelo contrário, brincalhão e irónico nops episódios de crítica social (ver os diálogos travados no jantar do Hotel Central - páginas 156 e seguintes). O diálogo é, n' Os Maias, a melhor forma de caracterização indirecta das personagens: de notar, por exemplo, como as falas de Alencar, em linguagem empolada e declamatória, o caracterizam como poeta ultra-romântico.
O discurso indirecto livre é uma das conquistas mais originais do Eça. É um dos processos que ele encontrou de conseguir uma maior economia de palavras, de matar a monotonia do discurso directo/indirecto e de se esconder, mediante a focalização interna, por detrás das personagens.
O lirismo (efusões líricas) é também uma agradável realidade nesta prosa de Eça. Manifesta-se sobretudo na descrição de espaços, quer interiores, quer exteriores, mas sobretudo na descrição do espaço rústico (paisagens). Esta irresistível tendência de Eça para a poetização dos espaços provém de uma outra tendência: fazer, pela animização desses espaços, que eles exprimam o estado emotivo de personagens, segundo a perspectiva das quais, esses quadros são traçados. Daí que as efusões líricas apareçam também frequentemente em monólogos interiores, dados, por vezes, em discurso indirecto livre. Por exemplo, o monólogo de Carlos da Maia, quando, inutilmente, tenta desligar-se de Maria Eduarda, ao saber que é sua irmã (páginas 653-654) e o monólogo com que o mesmo Carlos comenta a morte do avô (página 671 - "Carlos perdia-se nesta contemplação dolorosa..."
Aparece também o comentário do narrador para continuar, ou esclarecer a fala de uma personagem. É também um processo de, por uma espécie de discurso indirecto livre, cortar a fala de uma personagem e, ao mesmo tempo, exprimir ele o que aquela poderia dizer, evitando assim a monotonia do discurso directo. Na página 72, por exemplo, o comentário do narrador a sublinhar a repreensão de D. Ana à sobrinha por estar a brincar com Carlos ("Sempre detestara ver a sobrinha... a brincar assim com o Carlinhos..."
Recorda:
Modos de representação do discurso
Narração - utiliza-se para relatar os factos, fazendo avançar a acção; verbos de movimento no presente e no pretérito perfeito.
Descrição - utiliza-se para descrever, apresentar algo ou alguém de forma mais pormenorizada; adjectivos; verbos no pretérito imperfeito; valor aspectual dos verbos; recursos estilísticos (a comparação, a metáfora, a enumeração, a adjectivação).
Diálogo - utiliza-se para reproduzir a fala das personagens; discurso directo; grande proximidade espacial e temporal entre o emissor e o receptor do discurso.
Monólogo - acontece quando uma personagem está a falar consigo mesma; o locutor é o receptor de si próprio; o discurso é desordenado, condicionado pelo pensamento do emissor, subjectivo.
7. Modos de expressão literária
A descrição quase se equipara em importância, n' Os Maias, à narração. Ela corresponde ao desenvolvimento de subtítulo do romance "Cenas da Vida Romântica". Os episódios de crítica social são quadros descritivos em que as personagens aparecem irmanadas com os lugares. o impressionismo destas descrições provém da animização da natureza e das coisas, como prolongamento do interior das personagens. A descrição de interiores, mais frequente do que a de exteriores, reflecte a solidariedade personagem/habitação. A mudança de habitação surge sempre relacionada com novas etapas e vivências psicológicas das personagens.
A descrição de espaços, quer interiores, quer exteriores, é-nos quase sempre dada sob focalização interna de personagens. Veja-se, por exemplo, a descrição enquadrada no passeio de Carlos e Cruges a Seteais (pág. 233): "Cruges agora admirava o jardim..." Esta bela e impressionista descrição do jardim de Seteais é claramente perspectivada sob o olhar de artista de Cruges. Da mesma forma, a última descrição do Ramalhete e do seu espaço circundante (da pág. 707 a 710) é perspectivada por Carlos e Ega e reflecte bem o seu estado de espírito de desalento e profundo pessimismo. A descrição processa-se quase sempre numa dinâmica de fluir cinematográfico, dada sobretudo pelo uso do imperfeito verbal e do gerúndio, o que torna a linguagem mais visualista.
Os quadros descritivos partem sempre da realidade observada (ao contrário do que sucede no Romantismo), embora a imaginação do autor tudo eleve ao domínio do sonho, mediante expedientes estilísticos próprios de um realismo impressionista.
A narração processa-se quase sempre mediante o uso do perfeito verbal narrativo, ou do mais-que-perfeito. Nos episódios descritivos/narrativos surge mais vezes o imperfeito e o gerúndio. A narração torna-se mais sóbria na intriga trágica, apresentando-se com notável economia de palavras os acontecimentos numa sucessão apropriada à criação de suspense.
O diálogo tem uma importância muito grande. Este contribui para o ritmo lento que se verifica na narrativa central. O diálogo é emotivo, sério e elegante na intriga trágica (ver nas páginas 644 e seguintes, o diálogo em que Carlos comunica ao avô que Maria Eduarda é sua irmã); e, pelo contrário, brincalhão e irónico nops episódios de crítica social (ver os diálogos travados no jantar do Hotel Central - páginas 156 e seguintes). O diálogo é, n' Os Maias, a melhor forma de caracterização indirecta das personagens: de notar, por exemplo, como as falas de Alencar, em linguagem empolada e declamatória, o caracterizam como poeta ultra-romântico.
O discurso indirecto livre é uma das conquistas mais originais do Eça. É um dos processos que ele encontrou de conseguir uma maior economia de palavras, de matar a monotonia do discurso directo/indirecto e de se esconder, mediante a focalização interna, por detrás das personagens.
O lirismo (efusões líricas) é também uma agradável realidade nesta prosa de Eça. Manifesta-se sobretudo na descrição de espaços, quer interiores, quer exteriores, mas sobretudo na descrição do espaço rústico (paisagens). Esta irresistível tendência de Eça para a poetização dos espaços provém de uma outra tendência: fazer, pela animização desses espaços, que eles exprimam o estado emotivo de personagens, segundo a perspectiva das quais, esses quadros são traçados. Daí que as efusões líricas apareçam também frequentemente em monólogos interiores, dados, por vezes, em discurso indirecto livre. Por exemplo, o monólogo de Carlos da Maia, quando, inutilmente, tenta desligar-se de Maria Eduarda, ao saber que é sua irmã (páginas 653-654) e o monólogo com que o mesmo Carlos comenta a morte do avô (página 671 - "Carlos perdia-se nesta contemplação dolorosa..."
Aparece também o comentário do narrador para continuar, ou esclarecer a fala de uma personagem. É também um processo de, por uma espécie de discurso indirecto livre, cortar a fala de uma personagem e, ao mesmo tempo, exprimir ele o que aquela poderia dizer, evitando assim a monotonia do discurso directo. Na página 72, por exemplo, o comentário do narrador a sublinhar a repreensão de D. Ana à sobrinha por estar a brincar com Carlos ("Sempre detestara ver a sobrinha... a brincar assim com o Carlinhos..."
Recorda:
Modos de representação do discurso
Narração - utiliza-se para relatar os factos, fazendo avançar a acção; verbos de movimento no presente e no pretérito perfeito.
Descrição - utiliza-se para descrever, apresentar algo ou alguém de forma mais pormenorizada; adjectivos; verbos no pretérito imperfeito; valor aspectual dos verbos; recursos estilísticos (a comparação, a metáfora, a enumeração, a adjectivação).
Diálogo - utiliza-se para reproduzir a fala das personagens; discurso directo; grande proximidade espacial e temporal entre o emissor e o receptor do discurso.
Monólogo - acontece quando uma personagem está a falar consigo mesma; o locutor é o receptor de si próprio; o discurso é desordenado, condicionado pelo pensamento do emissor, subjectivo.
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